A liberdade, sob a ótica da Arte Real

Quando se procura uma definição do que é Maçonaria, a fim de firmar conceitos e de melhor entender a Ordem, buscando diretrizes que nos conduzam na senda da Arte Real – a senda do lapidar constantemente do nosso ser interior – nos encontramos a perpassar pela questão do que se entende por LIBERDADE.

Com o objectivo de definirmos posteriormente o que seja tal palavra, começamos a busca por determinada instrução do Aprendiz. Quando o Venerável pergunta em Loja se a Maçonaria universal “é um culto ou uma religião?”, obtém a resposta negativa, pois sendo ela uma instituição eclética, recebe os homens livres e de bons costumes, para conviverem fraternalmente como Irmãos, não sofrendo, assim, influências dogmáticas. Nesta primeira definição de Maçonaria encontramos algumas palavras ou conceitos importantes. Por exemplo, que ela é uma Instituição eclética.

Podemos definir o que é ecletismo: Denomina-se “ecletismo”, ou “ecleticismo”, a atitude intelectual daqueles filósofos que se limitam a examinar os resultados do pensamento alheio, escolhendo o que nele se lhes afigura verdadeiro e valioso, sem se darem ao trabalho de reunir num todo acabado os fragmentos recolhidos. Ecletismo como método também consiste em reunir teses de sistemas diversos ora simplesmente justapondo-as, ora chegando a reuni-las em uma unidade superior, nova e criadora. Caracteriza-se, enfim, pela escolha entre diferentes formas de conduta ou opinião, das que parecem melhores, sem observância de uma linha rígida de pensamento.

Partindo destas definições, vemos que a linha filosófica da Maçonaria deve ser realmente eclética, assim como a própria conduta do Maçom. O ecletismo é o primeiro passo à liberdade. O homem, livre e de bons costumes, já Iniciado na Nobre Arte, já estando dentro da instituição, deve conviver fraternalmente com os Irmãos, não sofrendo influências dogmáticas. Saber entender e conviver com o próximo é o exercício da liberdade.

Mas, o que é um dogma? É o ponto fundamental e indiscutível de um sistema ou doutrina religiosa. Dogmático significa “sem crítica”, ou o que não é passível de crítica ou de questionamentos. Como orientação científica, significa originalmente o contrário de ceticismo, pois o dogmatismo é toda filosofia em que a metafísica procura avançar sem crítica do conhecimento. Na neo-escolástica dá-se o nome de dogmatismo à chamada teoria das verdades fundamentais. De modo geral, pode caracterizar-se como dogmatismo toda concepção que pretenda subtrair suas afirmações e pressuposições de uma crítica justificativa. O dogmatismo, enquanto atitude pessoal tende a dizer em tudo a palavra definitiva, não tolerando a contradição.

Isto nos ensina como o Maçom não deve ser. Pelo contrário, por consequência, este deve ser mais tendente ao céptico, isto é, a procurar sempre a certeza, a verdade, partindo da dúvida universal relativa a todo conhecimento. A ciência deve ser também norteadora do Maçom. O Maçom, por ser livre, pode escolher e discernir entre o que considera certo ou errado.

E o que se pode entender por cepticismo? Que é a dúvida da possibilidade de um conhecimento verdadeiro. O ceticismo consiste ou em uma atitude de dúvida perante todo conhecimento, ou na doutrina mais ou menos cientificamente fundamentada sobre a dubitabilidade de todo conhecimento humano, religioso ou não. O ceticismo como método científico tem por fim a certeza, e escolhe para ponto de partida a dúvida universal relativa a todo conhecimento.

Ainda à procura de definições que nos levem ao aprofundamento da questão do que é a liberdade, passemos a trechos da Constituição do Grande Oriente do Brasil. Dos seus princípios gerais e dos postulados universais, sabe-se que a “Maçonaria é uma instituição essencialmente iniciática, filosófica, filantrópica, progressista e evolucionista. Proclama a prevalência do espírito sobre a matéria. Pugna pelo aperfeiçoamento moral, intelectual e social da humanidade, por meio do cumprimento inflexível do dever, da prática desinteressada da beneficência e da investigação constante da verdade. Seus fins supremos são a liberdade, a igualdade e a fraternidade.”

Cada uma destas palavras poderia ser comentada e debatida individualmente, gerando assim outros trabalhos. Porém, nos deteremos somente na questão da liberdade implícita no trecho anterior. Os fins supremos, liberdade, igualdade e fraternidade mostram a divisa que apareceu pela primeira vez durante a segunda República Francesa (1848-1852) em substituição à divisa original da Revolução Francesa de 1789: “Liberdade, Igualdade ou a Morte”. Era também uma forma de oposição à opressão clerical da época em relação aos Pedreiros Livres. O termo “morte” era diretamente dirigido aos membros da Família Real e da Monarquia, cujas famílias o povo francês, na época do Terror, queria destruir para desimpedir o advento da República.

Vamos definir individualmente cada uma das importantes palavras e, entre elas, principalmente a:

LIBERDADE: Um dos três princípios do lema emancipador da Maçonaria, e requisito exigido para admissão dos Irmãos. Como ser Iniciado se não somos senhores de nossas ideias, de nossos movimentos e tampouco de nossos destinos? A liberdade primeiramente diz respeito aos direitos naturais de todos os cidadãos de um Estado baseado no direito romano, garantindo a liberdade civil ditada pela sua Carta Magna ou Constituição. De modo geral, podemos praticar o que não é proibido por lei de um determinado país ou Estado. A Maçonaria, ao existir juridicamente em determinada nação, tem por dever limitar a sua liberdade de ação dentro dos parâmetros das leis daquele país.

Temos também a liberdade moral, própria e pessoal de cada indivíduo, e que se manifesta pelo livre arbítrio, ou o poder de fazer escolhas de acordo com a sua consciência. Por exemplo, entre o bem e o mal não só para si como para os demais indivíduos da sociedade. É uma regra sociológica por si só, sendo a utilização e o respeito ao livre arbítrio uma das condições mais difíceis para o ser humano, como se pode averiguar pela história. Como diz o ditado popular, “onde termina o nosso direito começa o do próximo”.

Enquanto instituição progressista e evolucionista que é, além de iniciática, a Maçonaria só pode estar em conflito com os que restringem a liberdade de consciência e de pensamento, pois estes são atributos inerentes a todos os homens, sem distinções de qualquer tipo, seja de raça, cor, credo, política ou religiosa, desde o nascimento. São valores de ordem inclusive metafísica na busca pelo conhecimento e a verdade. Ambos, conhecimento e verdade, são alguns dos alicerces para uma sociedade melhor e mais justa e, para alcançá-los, deve-se ser livre. Logo, um homem que não seja livre em todos os sentidos não pode ser Maçom, pois devemos ser livres e de bons costumes para o cumprimento de nossos deveres dentro e fora da Ordem. Como um escravo buscará o verdadeiro conhecimento? Esta questão é central no entendimento do que seja a liberdade.

IGUALDADE: Qualidade ou estado de igual, propondo a equidade e a justiça. A maçonaria reconhece que todos os homens nasceram iguais, e as únicas distinções que admite são o mérito, o talento, a sabedoria, a virtude e o trabalho. Existe igualdade quando os direitos e os deveres, as prescrições e as penas, são iguais para todos os cidadãos, sem consideração ao nascimento e à fortuna. Este é um princípio altamente espiritual e filantrópico.

FRATERNIDADE: Este é um dos grandes objetivos da Maçonaria, fazendo por isso parte do lema maçônico. Significa o parentesco de irmãos, irmandade. Procuramos a grande fraternidade entre todos os homens, onde todos tenham os mesmos direitos e oportunidades, independentemente das diferenças sociais e culturais. Somos todos Irmãos no seio de uma grandiosa família universal. Este lema está diretamente relacionado com a moral e os bons costumes que, certamente, conduzem os homens sempre à fraternidade e amor ao próximo. Subentende-se, também, a união harmoniosa e pacífica entre os irmãos.

Conclusão

A Ordem Maçônica sempre esteve presente nos grandes acontecimentos históricos que reivindicaram a melhoria dos povos através da “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, lema histórico e universal. Cabe a cada Irmão do presente, e do futuro, manter esse lema presente em nossas flâmulas.

Que os Irmãos vivam em união!

Adílio Jorge Marques

Bibliografia

A Simbólica Maçónica. Jules BOUCHER.
Dicionário da Língua Portuguesa. Aurélio Buarque de HOLANDA.
Dicionário de Filosofia. Walter BURGGER.
Grande Dicionário Enciclopédico de Maçonaria e Simbologia. Nicola ASLAN.
Grau do Aprendiz e Seus Mistérios. Jorge ADOUM.
Introdução ao pensamento de S. Martin e J. Boehme. Adílio Jorge MARQUES.
Rituais do Grau I do Grande Oriente do Brasil.

Fonte: https://www.freemason.pt/