As faces da lua e da vida

 

Houve um tempo em que as dúvidas eram mais siples. Não pelo tamanho e a idade que se tinha, mas porque a vida vai deixando a brincadeira mais complexa - para que a gente não se entedie dela.

 

Quando deu para perceber que a lua mudava de formato lá no céu, a grande curiosidade era descobrir qual seria a primeira cara dela. Nem faz tanto tempo, mas não dava para jogar a pergunta na internet. E quando a gente não sabia o porquê de alguma coisa e os adultos não podiam ajudar, tinha que caçar algum volume da enciclopédia Barra para sossegar a mente. Não era melhor nem pior. Era diferente. Havia uma demora no ar, um tempo de pesquisa nosso - e não dos algoritmos de busca. Uma sensação boa que talvez só as almas mais analógicas sejam capazes de conseguir identificar.

 

Pois bem lá estava descrita a jornada da lua perto da gente. Havia até um nome para essa volta que ela d[a ao longo de quase um mês: lunação. Começa na fase nova, passa o bastão para a crescente, atinge seu auge na cheia para depois minguar e começar tudo de novo. Repetidamente. Sem reclamar. Essa ordem obrigatória não desceu muito bem. Parecia papo de lunático. Afinal, qual seria a graça dessa rotina sem grandes novidades? 

 

Começa na fase nova, passa o bastão para a crescente, atinge seu auge na cheia para depois minguar e começar tudo de novo. Repetidamente. Sem reclamar.

Talvez nós sejamos a boa nova na vida da lua. Nossos dias minguados, chateados, encolhidos e com pouca ou nenhuma vontade de enfrentar mais uma onda forte da vida. Nossos dias novos, cheios de energia, com cara de planos, ideias mirabolantes e brilha nos olhos de começo de história feliz. Nossos dias crescentes que nos esticam, nos testam e nos mostram até onde podemos chegar. Nossos dias cheios, na cabeça e no coração; dias de “eu não aguento mais”; dias de “eu não vou dar conta”; dias de “que fase!”.

 

Crenças à parte, alguma força também vem desse astro lunar. Algo que nos assiste de maneira calma e tranquila. Prestando atenção. Sem dar conselhos. Sem interferir nos nossos passos. Algo que quase diz: olha. a minha jornada se repete todos os meses, mas a sua não precisa ser igual. 

 

A noite chegou, e com ela, o cansaço do dia, o silêncio e o espetáculo da cara da lua no céu.

 

Mais uma vez, tão perto e tão distante. Luminosa, contemplando o que fazemos dessas nossas vidas onde tudo pode acontecer. Tão maravilhosa e cheia que quase transbordava partículas de poeira daquele seu perfeito círculo de manchas imperfeitas.

 

Aí essa saudosa história bateu na cabeça pedindo licença. E quando lembranças assim pedem para entrar, a gente abre a porta e agradece - escutando bonito o que a lua tenta e não consegue nos dizer.

 

Que fazes com a gente, lua? Que bela fase essa que enxergamos agora!

 

Thais Ferreira Gattás.

 

thaisferreiragattas@gmail.com