Caixa de Pandora,

No baú das histórias que nos contam, é comum que verdade, opinião e mito se confundam numa mistura quase homogênea. Tudo que se relata, tem um pouco e si. Seja como for, contam-nos uma, em particular, que enche os olhos de curiosidade.

Vem de longe, de uma península extensa e exuberante que ostenta um quê de origem e de significado em relação a quase tudo que movimenta nossas precárias existências.

Na Grécia, quase tudo está a ruir. Contudo, além dos preciosos achados arqueológicos e das incontáveis maravilhas arquitetônicas, o que parece sobreviver a qualquer intempérie do tempo é a mitologia – esse conjunto de saberes (ou achismos) que nos explica um pouco sobre nós em um mundo tão complexo.

Com todo o respeito à religião de cada um, esqueçamos Eva por um só segundo. Na visão grega, a primeira mulher criada por Zeus chegou à terra e recebeu o nome de Pandora. Quando a história quer ser muito resumida, limitam-se a dizer que ela teria recebido como presente de casamento um jarro que continha todos os males do mundo. Curiosa, destampou o objeto e deixou que as coisas ruins escapassem por aí. Seria assim, responsável apenas por todas as tragédias humanas que vivemos até hoje. Coitada da Pandora! Ah, a curiosidade – sempre matando o gato. Assustada com aquela explosão de atrocidades, Pandora fechou rapidamente o jarro ou a caixa antes que a esperança pudesse sair. A história se modifica nos detalhes de seus contadores, mas a ideia permanece intacta. Que bobagem de mito, alguns dirão. Para crendice, outros exaltarão. Bem coisa de mulher, engraçadinhos pouco reflexivos postarão em suas redes sociais.

O problema nunca está na história que se conta. O que nos cega é a capacidade de enxergar nas entrelinhas.

Com todo o respeito à religião de cada um, esqueçamos Eva por um só segundo. Na visão grega, a primeira mulher criada por Zeus chegou à terra e recebeu o nome de Pandora.

 

Num enredo de fácil compreensão, quase uma fábula, se não taparmos os olhos e os ouvidos, podemos aprender alguma coisa com os gregos. A esperança parece necessária à sobrevivência da humanidade. A última que morre e que não foi destruída por nosso egoísmo e ambição pelo poder.

Nesses tempos em que os meios de comunicação nos informam de confrontos de gente da mesma espécie numa luta desenfreada entre o que dizem ser o bem e o mal, tai o que tanto nos falta, o bem mais precioso da atualidade. Enquanto acharmos que estamos perdidos se a esperança estiver na caixa, estamos errados. Uns contra os outros – estamos sós no barco. Pois o verdadeiro grande mal é o que nos impede de ouvir e faz com que no olhar não olhe direito nada nem ninguém, por detrás de uma reluzente tela de celular.

Há uma expressão americana que fala sobre a importância de pensarmos fora da caixa para melhorar as coisas da vida. Fico a pensar se ela foi inspirada em Pandora: essa moça que, se existiu, até hoje paga um preço muito alto pelas coisas que não tentamos consertar verdadeiramente. Nossos melhores sentimentos também parecem estar confinados numa caixa escura. Faltaria só coragem para nos destamparmos juntos e de uma vez por todas desse lugar tão apertado?

Autora

Thais Ferreira Gattás.

É escritora. Observadora da vida, tenta traduzi-la com a delicadeza de um buquê de flores. Escreve todas as sextas-feiras para o jornal Notícias do Dia e é colaboradora do jornal Psicologia em Foco. Atua também como criadora de conteúde e roteirista para os mais diversos veículos de comunicação.