Como tornar feliz a humanidade

Num belo dia de verão de 1981 o astrônomo Carl Sagan, se reunia com uma equipe de filmagem para levar a termo seu mais ambicioso projeto, a aclamada série “Cosmos”, que tinha como foco, popularizar a astronomia para as pessoas comuns.

Mais do que falar sobre astronomia, a grande questão levantada por Sagan era tentar responder a uma pergunta que já havia tirado o sono de milhões de pessoas ao longo da história, “como fazer a humanidade alcançar o equilíbrio, a fim de que, com isso, se pudesse chegar a tão almejada “felicidade”.

Por mais que sua tentativa de popularizar a ciência tenha sido bem-sucedida, a pergunta em questão continuou no limbo existencial e, como já havia ocorrido em milhões de outras ocasiões, continuou sem respostas. Mas, por que responder a uma pergunta que parece tão óbvia então difícil. Antes de responder a tal paradigma, precisamos analisar a questão sob algumas perspectivas que são essenciais. A primeira delas é definir “o que é felicidade”. Esse é um conceito deveras complexo. Se pegarmos a fria letra do vernáculo, chegaremos a um conceito proposto por qualquer dicionário que se aproxima do seguinte: felicidade é: “qualidade ou estado de feliz; estado de uma consciência plenamente satisfeita; satisfação, contentamento, bem-estar” (PRIBERAM. 2021 - ONLINE).

Epicuro explica que, “ser feliz consiste na necessidade de controlar os nossos medos e desejos, de maneira que o estado de prazer seja estável e equilibrado, com um consequente estado de tranquilidade e de ausência de perturbação, dessa forma, a combinação desses dois estados constituiria a felicidade na sua forma mais elevada”.

Já Aristóteles, “a felicidade consiste em uma atividade da alma conforme a virtude”. É o bem supremo, que tem um fim em si mesmo, sendo almejado por todos. O que constitui a felicidade são as ações virtuosas, e as atividades viciosas conduzem ao contrário.

A partir dessas definições, podemos recolher alguns pontos importantes sobe a felicidade:
A felicidade é um estado, não uma característica; em outras palavras, não é uma característica ou traço de personalidade duradouro e permanente, mas um estado mais fugaz e mutável;
A felicidade é equiparada a sentir prazer ou contentamento;
A felicidade pode ser sentida ou demonstrada, o que significa que a felicidade não é necessariamente uma experiência interna ou externa, mas pode ser ambas.

Para Schopenhauer, a felicidade é um estado utópico, que necessita de uma avaliação temporal curta para ser avaliada, visto que, no seu entender, não existe felicidade duradoura ou eterna, mas sim, momentânea, fugaz. O mito de alcançar a felicidade seria comparável a alcançar algo intangível, visto que ao longo da vida de uma pessoa, impossível seria dizer que a mesma vive plena felicidade o tempo todo, já que a vida, por natureza, nos proporciona, também momentos de tristeza, que são necessários para manter nossa noção de realidade. A felicidade

Ainda segundo Schopenhauer a vida é composta de momentos que se sobrepõem sobre determinadas circunstâncias e, nem todas são favoráveis ao ser humano, assim sendo é normal que a tristeza ou mesmo a apatia façam parte do viver. Todos somos testados no teatro da vida e, tal qual o teatro cênico é preciso saber conviver com momentos alegres e outros tristes, dessa forma a tristeza e a felicidade são lados opostos da mesma moeda, a moeda da efemeridade.

Se a vida é efêmera, a felicidade e a tristeza também são, cabe ao ser humano saber dosar esses momentos e ter equilíbrio passar  por eles, pois, como bem salienta Demócrito, “não há nada que o tempo não cure”. Paixões, guerras, amores, desilusões, êxtase, euforia entre outros sentimentos diversos são puramente passageiros do templo e, por ele, serão depurados.

Mais difícil ainda é responder à pergunta de “como tornar a humanidade feliz”, visto que nessa pergunta está implícito o desejo de uma coletividade. Se tentar responder tal pergunta no âmbito privado já é complexo, imagine fazê-la no âmbito coletivo? A grande dificuldade de responder a essa máxima está em conseguir conciliar interesses, que na maior parte dos casos são inconciliáveis. Para que a humanidade pudesse alcançar a tão esperada felicidade seria necessário que todos tivessem aspirações comuns e conceitos definidamente iguais o que é no mínimo esdrúxulo.

Essa concepção torna-se prevalentemente difícil porque as pessoas têm visões de mundo diferentes e o que é felicidade para uns, pode não ser para outros. Os interesses humanos divergem e dificilmente conseguiria conciliá-los, enquanto a população mundial já se aproxima de 8 bilhões de habitantes. Um único indivíduo que não concordasse com a ideia de felicidade coletiva faria cair por terra todo o conceito, já que esse indivíduo também faz parte da chamada “humanidade”.

Assim sendo, se a felicidade ampla e irrestrita é algo impossível, então, o que devemos fazer? Cruzar os braços e aceitar o fatídico destino dos desalentados? Não!

Se não é possível alcançar a felicidade para todos devemos buscá-la para o máximo de pessoas possíveis e não apenas para nós mesmos, pois o ser humano, como bem define Aristóteles é um ser social e, portanto, necessita da coletividade para viver e sobreviver, dessa forma, nossa felicidade só será ampla se a comunidade que nos cerca estiver em equilíbrio.

Enquanto nos entregarmos ao egoísmo de pensar apenas em nosso próprios problemas, estaremos construindo ilhas de felicidade cercadas de tragédias e tristeza por todos os lados e, neste contexto, devemos nos perguntar: “vale a pena isso”, construir um mini paraíso particular cercado de desgraça e destruição por todos os lados? Não! Não vale.

O ser humano só se completa com o sentimento de paz interior, pois, é esse sentimento que lhe traz equilíbrio existencial. Enquanto houver pessoas passando fome, contendas, pobreza e calamidade, enquanto houver desigualdade abissal, enquanto houver preconceito, não será possível sequer pensar em felicidade.

Não há como pensar em felicidade enquanto crianças morrem de fome, pais se drogam, irmãos se digladiam por um lugar ao sol ou simplesmente pelo direito de existir. É possível resolver esses problemas?

Tal como a pergunta sobre a felicidade, seria ingênuo acreditar que essas questões teriam uma resposta simplista. Não, não é possível resolver todos os males do mundo, o que podemos é minimizá-los a ponto de deixar menos desigual a balança entre tristeza e felicidade, para tanto é necessária uma maior elevação da consciência humana, evoluindo do pensamento privado para o coletivo e nos fazendo crer que, o que afeta a um, afeta a todos e, portanto, não se é possível ser feliz sozinho, como bem cita o samba de Tom Jobim.

Mas, se não é possível tornar a humanidade plenamente feliz, então o que fazer? Tornar as pessoas conscientes do seu papel social. Pois quanto mais consciente é uma sociedade, mais feliz ela é e se assim fizermos em uma escala global, talvez o sonho de tornar a humanidade mais feliz, um dia possa deixar o plano da utopia e, quem sabe, possa realmente acontecer, mesmo que tal desejo, por enquanto não passe de um sonho.

Para tanto devemos nos inspirar nas palavras do apóstolo Pauli, na carta aos Filipenses, “tudo posso naquele que me fortalece” (Filip: 4:13).

Narciso Bastos Portela
“União e Resistência” Nº 30 e “Fênix de Brasília” Nº 40
Grande Loja Maçônica do Distrito Federal - GLMDF

Fonte: Revista M∴ B∴ Nº 12 - Maio de 2022