Conteúdo Filosófico, Simbólico e Iniciático do Primeiro Grau

“O profano que foi recebido maçom, segundo as formas tradicionais, não adquiriu por este único fato aquelas qualidades que distinguem o pensador ilustrado do homem rude e inculto. [...] O aprendiz Maçom tem, portanto, como primeiro dever o de meditar os ensinamentos do Ritual a fim de proceder em conformidade com eles”.
(
OSWALD WIRTH, O LIVRO DO APRENDIZ)

O início da Maçonaria remonta ao ano de 1717, data da constituição da Grande Loja em Londres, que nasceu como uma irmandade do tipo Iniciativa com o objetivo principal de fazer com que seus membros se estimem e se amem mutuamente, mesmo que sejam distanciados por sua maneira de pensar ou se expressar. A finalidade desta instituição era formar maçons capazes de se entender de um pólo a outro para juntos construir um templo único, mas visto este edifício "não como uma torre destinada a desafiar o céu com seu orgulho, mas um santuário cujo plano concebeu o Grande Arquiteto do Universo".

Na Declaração de Princípios, declara-se: “A Maçonaria é uma Instituição universal, essencialmente ética, filosófica e Iniciática, cuja estrutura fundamental é constituída por um sistema educacional, tradicional e simbólico; “Através de seus membros projeta sobre a sociedade humana a ação benfeitora dos valores e ideais que sustenta”.

Começamos na primeira série, com nossa jornada que começa no Ocidente, onde estamos cercados de aparências que acreditamos serem reais, onde para o materialista sua jornada termina, mas não para quem quer ver além, isto é, o iniciado. Assim, “ao penetrar desta forma na tenebrosa selva das quimeras com tanta complacência descrita nos romances de cavalaria, o pensador é obrigado a combater todos os monstros de sua própria imaginação” (Wirth, 2018) para depois chegar ao Oriente de onde brota a luz. No entanto, ao sair da escuridão da noite e ver o flash da luz, tão cega ao tirar a venda, percebemos nossa impotência para penetrar no mistério das coisas, tendo que percorrer novamente o caminho, mas agora seguindo a rota do meio-dia.

Esta é a rota que percorremos simbolicamente em nosso caminho maçônico, um caminho que para o Aprendiz é escuro e pedregoso, onde nós mesmos somos o principal obstáculo a ser superado. No entanto, a persistência de ser maçom depositada na força, nos dá a esperança de que, à meia-noite, a venda que cobre nossos olhos se torne cada vez mais fina a ponto de voltar a ver aquela luz que danificou nossa visão em nossa noite de iniciação.

Ao contrário de outras doutrinas, a Iniciação não possui a virtude de ser uma fórmula sacramental (ou mágica) de nos tornarmos, aprendizes, o homem esclarecido que a Ordem requer. Não nos dá, de forma alguma, por si só as qualidades que nos distinguem de um leigo, mas constitui o primeiro passo para o nosso desenvolvimento na arte da construção humana; a Arte Real (Escobar Martínez, 2009).

O primeiro dever que temos como aprendizes é meditar os ensinamentos do ritual a fim de proceder de acordo com eles. Este é o dever por excelência que contraímos antes de receber a luz.

Espera-se que a meditação de todas as suas perspectivas nos permita avançar em nosso autoconhecimento na esperança de uma melhoria contínua. Esta tarefa é difícil de executar porque é o próprio Aprendiz, de sua posição e com todos com seus defeitos de herança, que deve ter a capacidade de se autocorreção.

PERSPECTIVA FILOSÓFICA

“A filosofia em um apetite de sabedoria divina, o desejo de se assemelhar a Deus no que diz respeito ao homem é possível.”
PITÁGORAS

A filosofia nasce como uma invenção teórica feita com a intenção de enfrentar os problemas da natureza a partir de uma perspectiva racional, sendo a primeira forma metódica e rigorosa que através da razão tentou responder perguntas essenciais que o homem se fez. É, em vez disso, a primeira ciência que tentou alcançar o conhecimento de forma sistemática e metódica (Touma Lazo, 2015).

Da declaração de princípios, deduzimos que nossa augusta Ordem, mais do que ter uma filosofia, é profundamente filosófica. A essência disso se reflete em que: quer que o homem supere sua animalidade, aspire ao conhecimento em si mesmo, o ajude a descobrir o sentido de sua vida e seu próprio destino e o estimule a ser melhor de acordo com um ideal superior.

A perspectiva filosófica do Primeiro Grau implica uma meditação manifesta em busca da verdade e no conhecimento de si mesmo, desde o passo voluntário da iniciação até o rito do trabalho, consistindo em vencer as próprias paixões, submeter a vontade e progredir humildemente no conhecimento simbólico para conhecer o próprio caos interno. Só então, o Aprendiz estará em condições de receber o merecido aumento salarial.

Esta auto-observação deve ser direcionada para o nosso próprio interior, usando o plumo ou luz da consciência, pois os caminhos a serem percorridos são escuros, por isso devemos observar atentamente as diferentes arestas de nossa pedra bruta e escolher, a partir de nossa condição de iniciados, qual das diferentes arestas serão desbastadas e quais vale a pena conservar (Touma Lazo, 2015).

Seu objetivo é transformar o profano em um novo homem, elevá-lo acima da condição comum de seus pares.

Espera-se do Aprendiz que após a viagem completa por seu grau, ou seja, depois de analisar corretamente o significado do Primeiro Grau, conheça seu verdadeiro caos interior para responder à grande pergunta filosófica: de onde venho? Esta questão implica uma reflexão sobre a própria natureza e o propósito da existência. Consiste no despojamento dos metais ou, melhor, busca nos concentrar em nós mesmos, no autoconhecimento e no autocontrole.

Também, de uma perspectiva filosófica, relacionada com a filosofia hermética ligada a Hermes Trimegisto(1), que consiste em uma compreensão profunda de um ensinamento que brota do interior do ser humano quando exerce vontade e pratica o silêncio, sob a máxima "conhece-se a si mesmo".

O conhecimento obtido através deste exercício hermético se manifesta quando o Aprendiz entra na Câmara de Reflexões, momento em que transita para sua própria consciência, para o centro da terra, onde, em um ambiente sombrio, aceita a morte do profano insinuado, o mesmo que com desordem interrompeu os trabalhos. No entanto, a aceitação desta morte, lhe dá acesso a um novo caminho; o caminho do Aprendiz.

CONTEÚDO SIMBÓLICO

O Ritual do Grau serve de símbolos para oferecer a cada individualidade pensante, dentro de sua objetividade pessoal, uma ou várias facetas de um mesmo conhecimento. Ao contrário de outros símbolos, os símbolos maçônicos falam em uma linguagem diferente para cada intérprete, dando mais nitidez à própria iluminação interior para que a reflexão pessoal brote a centelha da verdade. Em outras palavras, o Aprendiz deve tomar o símbolo como um veículo para alcançar o conhecimento e não vê-lo como um objeto de culto.

De onde foram obtidos os símbolos? A própria observação do cosmos inspirou os primeiros pensadores, que consideravam o Sol e a Lua como elementos-chave em suas vidas. Mas, a Maçonaria Moderna se baseou ainda, nos mestres operacionais que construíram os Templos cristãos, e seus símbolos foram legados à Maçonaria especulativa. São elementos simbólicos como o Sol e a Lua que decoram o Oriente da Loja. Outros símbolos foram retirados das ferramentas de trabalho dos próprios pedreiros; como o Maço, o Cinzel (Faúndez Catalán, 2016).

O Maço e o Cinzel são as ferramentas básicas que o Aprendiz usa para desbastar a pedra bruta com o objetivo de transformá-la em uma rocha humilde que então apresentará à oficina e depois fingirá, talvez com ingenuidade, que tem a aptidão necessária para começar a dar-lhe Beleza (aumento de salário). Assim, o Aprendiz toma o Maço, símbolo de vontade bem dirigida, levando o Cinzel ao ponto onde sua ação é desejável, de modo que a pedra bruta, pouco a pouco adquire superficialmente a forma que terá de aperfeiçoar para que seja digna de um edifício a ser construído, sempre dirigido pela chumbada que significa a luz da consciência (Touma Lazo, 2015).

A pedra bruta, por sua vez, é a nossa essência natural, é a forma que temos no momento de sermos descobertos na pedreira, com todos os defeitos de herança, mas com material precioso oculto (virtude) que aquele Irmão viu no momento de propor nosso nome.

O avental, por sua vez, é o implemento que cobre a frente do corpo das impurezas. Não se destina apenas a evitar a sujeira, mas também busca proteger espiritualmente o Aprendiz da contaminação de seus próprios vícios. O avental é feito simbolicamente com pele de cordeiro, que representa a pureza da vida e a retidão de comportamento.

CONTEÚDO INICIÁTICO

A maçonaria é, em essência, uma escola iniciática, ou seja, destinada ao aprendizado,

Ao exercício e magistério da verdade e da virtude. Reúne o legado de civilizações antigas que buscavam iniciar o ser humano na busca de seu pleno desenvolvimento por meio de alegorias e símbolos.

Que seja iniciática, significa que se passa pelo caminho da iniciação, ou seja, não responde a princípios proselitistas, mas que escolhe e escolhe aqueles que aspiram a chegar ao seu seio. Envolve a ideia de nascer em uma nova vida e, consequentemente, morrer em uma anterior. É uma instituição de natureza moral, onde seus membros são obrigados a manter segredo, ensinando seus ensinamentos gradualmente através de símbolos relacionados principalmente à geometria. Em outras palavras, o Ritual de Primeiro Grau, e principalmente o Ritual de Iniciação, equivalem a uma mutação ontológica (mudança do ser) que não ocorre de forma instantânea, mas é produto de um incessante trabalho interno que o Aprendiz deve fazer ao longo de sua vida. O Ritual de Iniciação os desafia a refletir sobre toda a bagagem cultural já concebida, a convidá-los a questionar sua validade para depois chegar a novas conclusões fundamentadas.

REFLEXÕES FINAIS

Dentro dos diferentes deveres do Aprendiz, o principal é desvendar o significado do Ritual, refletir sobre ele para descobrir através de um exercício reflexivo e pessoal a essência da verdade representada pela luz.

Do ponto de vista filosófico, a maçonaria deve ser entendida como aquele esforço pessoal dirigido ao estudo e ânimo de reflexão interna realizado a partir de uma perspectiva individual. Chama a manter uma inquietação intelectual viva, a ter espírito inquieto, a levar o Aprendiz pelo difícil caminho de interpretar aquilo que pretende (a Luz), a mantê-lo sempre como receptor vivo do conhecimento.

Da mesma forma, o Ritual pode ser visto de um ponto de vista simbólico, porque o conhecimento é concedido através de uma linguagem que requer interpretação. Isso significa que não é de forma alguma um conhecimento revelado, mas é um conhecimento que requer um esforço intelectual e espiritual adicional de interpretação e do qual, infelizmente, apenas um conhecimento parcial é alcançado porque inesgotável é o seu conteúdo e infinito é o caminho.

Assim, a Ordem apela ao espírito reflexivo do Aprendiz de tal forma que este deve por si mesmo descobrir, através de símbolos, os mistérios que lhe são revelados, principalmente, no ritual de iniciação e nas Sessões a que assiste, de tal forma que, embora “algumas indicações marcarão o caminho a seguir", em nenhum caso lhe será concedido um conhecimento revelado. Em suma, apela-se à formação de pensadores independentes, inquietos na busca incessante da verdade.

Finalmente, visto o Ritual de uma perspectiva iniciática, marca o início do caminho onde o primeiro desafio se refere a que o Aprendiz deve encontrar o mesmo, de tal forma que o coloca em uma posição de questionamento. Leva-o a um diálogo com a sua própria consciência, onde deve identificar as suas virtudes para as conservar, mas muito mais identificar as suas carências, porque o caminho a percorrer é pessoal e cheio de dificuldades.

Como Aprendizes - como iniciados - cruzamos o limiar que está mais próximo da luz. As paixões, vaidades, hierarquias e fortunas ficaram de fora junto com todos os dogmas e preconceitos, ficando livres de toda preocupação. Assim, dotado de uma nova atitude (atitude maçônica), o Aprendiz deveria adotar uma posição com o sincero espírito de trabalhar em si mesmo, conscientemente.

Quando no início de nossos trabalhos ouvimos: “Silêncio na Loja, meus irmãos”, entendemos que é a ordem de adotar essa atitude, a de analisar o Ritual de Primeiro Grau, silenciar o profano interior que o Aprendiz carrega dentro e silenciar seu cérebro da agitação improdutiva. Ou seja, em outras palavras, ter um domínio de si mesmos, de suas paixões: adotar uma atitude maçônica.

Quando o trabalho começa ao meio-dia, é o momento em que o sol está em seu ponto mais alto, acima de nossas cabeças. E quando chega a meia-noite, refere-se que o sol deixou de nos iluminar, trazendo consigo a escuridão iluminada com o único reflexo da luz através da lua, ou seja, vemos uma aparência, vemos sombras em um sentido platônico(2), merecendo o termo do nosso trabalho. Além disso, o sol pode simbolizar o momento de maior iluminação do nosso espírito, que não necessariamente coincide com a Iniciação, mas é, especificamente, com aquele momento em que se adota a atitude maçônica. Por outro lado, quando o trabalho termina à meia-noite, pode representar a morte.

Enfim, o objetivo da análise do Ritual de Primeiro Grau em todas as suas perspectivas é transformar o Aprendiz em um homem Novo, de elevá-lo acima da condição comum de seus pares, trazendo a florescer a potencialidade que se observava no profano. Mas essas condições não estão presentes de forma flagrante nos Aprendizes, mas são habilidades que estão em potencial, escondidas, cobertas por uma forte massa de pedra que precisa ser debastada. É por isso que o trabalho de desbastar a pedra deve ser cuidadoso porque, por mais que a camada que cobre as potencialidades possa ser vista como uma massa de pedra inofensiva e fina, a verdade é que se deve ter o autocontrole suficiente sobre si mesmo para que as próprias paixões, os próprios defeitos de herança, sejam transformados por nós mesmos com a Força do grau.

O caminho iniciático é difícil e doloroso porque nunca termina. É neste grau que se dá início a este longo caminho, onde o Aprendiz deve olhar para si mesmo e superar em todos os sentidos o profano que chegou à oficina batendo desordenadamente as portas do Templo.

Jean Franco Bravo Fuenzalida
A.·.R.·.L.·.S.·. “Norte” Nº 41
Santiago do Chile
Tradução livre: Juarez de Oliveira Castro

Notas:
Hermes Trimegisto ou “Três Vezes o Grande”. Diz-se que um homem de grande sabedoria e conhecimento surgiu no Egito, dos quais ele ensinou sob o juramento de comunicá-las apenas àqueles que foram submetidos a duras provações. Este segredo tinha o nome de "arte sacerdotal" e compreendia alquimia, astrologia, ciência com os espíritos e magia (Rojas, 2019).
Representa a história de prisioneiros que nunca viram o mundo fora da caverna em que nasceram. Um dia, um dos prisioneiros conseguiu sair e descobriu que o mundo não era como eles imaginavam, mas que eles viviam em uma ilusão sensorial.

Fonte: "Revista Maçônica Chile"