Homem não chora (crônica).

Cresci ouvindo dizer que o homem não chora. Mas tenho recorrentemente lembrado a cena final do filme “Perfume de mulher”. Não a versão americana, que é ruim, muito ruim, como em geral o cinema americano se nos apresenta. Afinal, ver a extrema arrogância ianque de um militar com poderes quase mágicos destrói qualquer sentido artístico ou sensível de uma obra que se pretenda artística. 

Por um lado, esta versão parece uma deliberada antítese do original italiano, em cujo herói era um personagem patético, que errava o tempo todo. Sim, o filme italiano de 1974, dirigido por Dino Risi. Na cena final o protagonista, personificado por Vitorio Gassman, leva um tombo. Aquele homem cego e bruto, que agredia o mundo e uma mulher teimosamente apaixonada simplesmente leva um tombo. Toda sua fragilidade escondida se revelou num tombo, num grito, num olhar de homem cegado pela guerra que chama pela mulher. Um amor imaturo entre pessoas desesperadas. Tão humano.

Cresci ouvindo dizer que homem não chora. Acho que por isto comecei a compor músicas e fazer poemas tão tarde. Estou gripado, cachaça com limão é um ótimo remédio. Mas também ando meio triste, cerveja dá uma alegria danada. Um vinho pra esquentar e lá vamos – folião de raça! 

Homem não chora e ressaca se cura com cerveja gelada. Foi só um tropeço, não levei aquele tombo ainda (ainda?). Um tiro hollywoodiano de raspão no braço esquerdo, mas o herói vai vencer no final da história. Ou, pelo menos, a mocinha virá atender ao chamado do herói patético que levou um tombo. Meu filho Francisco, se foi com quatro meses, ou melhor, cinco meses antes de nascer. E aquela enteada se foi com um canastrão qualquer. Queria tanto dizer pro Chiquinho: – Pode chorar, meu filho.

Foi só um tropeço e os bares na Vila Isabel amanhã abrem cedo.  E existe uma paixão que mora na Lapa, existe a flautista mais linda do Rio de Janeiro, existe uma moça em Copacabana, existe uma possibilidade em cada poema. Existe uma primavera e o desespero. Vinícius, me aponte um caminho, antes que minhas vistas se embacem de uma vez. Por que existe uma orgânica barriga e estes cabelos brancos que insistem sempre. E os amores se foram. 

E agora Drummond?

Amanhã recomeço. 

* Sandor Buys  

Publicado originalmente no “Portal Luís Nassif”.

(texto registrado na Biblioteca Nacional)