Horizontes possíveis em Maçonaria
Não tenho certeza, mas penso que nunca se escreveu tanto sobre Maçonaria neste país.
Isso é bom, pois se maçons estão escrevendo, é porque estão lendo. Inverto a norma maquiavélica de que os meios justificam os fins: nesse caso os meios utilizados justificam os fins alcançados. Mesmo quando uma plêiade ainda escreve pelos cotovelos, o que vale é estarem lendo, coordenando ideias e transformando ideias em palavras. Cumpre-se o objetivo maior da Maçonaria que é pensar e livre-pensar; e se pensam, “logo existem”. Acho que dessa forma todo mundo sai satisfeito, inclusive Descartes e Maquiavel. Cabe aos perfeccionistas trazerem aquela peneira formidável e, com certeza, após uma vigorosa peneiração há de se separar o fino grão do cascalho inútil. Mais ou menos como aquela história do caçador que viu um elefante ser soterrado numa montanha de areia; pegou uma peneira e após peneireiro o que sobrou era elefante.
Uma Loja não é uma escolinha onde o Oriente ensina ou impõe, e o Ocidente vota tudo sem questionar. Mesmo que a palavra “volte a circular” duas, três, dez, cem vezes, o assunto tem que ser esgotado (independentemente do “rito”) e mesmo em se tratando da Ordem do Dia preferida: o refrigerante da festinha semanal em homenagem às mães, aos pais, aos avós, etc.
EXCEÇÕES ÀS REGRAS:
Estes exemplos, exceções às regras, confirmam a regra de ouro.
Todos sabem (ou deveriam saber) que a boa e velha Inglaterra registrou, nos tempos d’antanho, atrocidades contra a liberdade política e religiosa. Em 29 de dezembro de 1170, quatro maus companheiros − Reginald Fitzurse, Hugh de Moreville, William de Traci e Richard le Breton − entraram na Catedral de Canterbury e assassinaram Thomas Becket, antigo Chanceler do Reino e Arcebispo Primaz da Igreja Católica. Dizem que os quatro celerados teriam interpretado mal as palavras do Rei Henrique II, o Plantageneta: “Não haverá ninguém capaz de me livrar deste padre turbulento?”. Padre turbulento porque Thomas Becket não concordava com as pilantragens do monarca. Thomas Becket foi canonizado três anos mais tarde e virou São Thomas Becket. Orem por ele!
Não aprenderam a lição e 365 anos mais tarde, Thomas Morus − filósofo, homem de estado, diplomata, escritor, advogado, homem de leis, e também Chanceler do Reino, foi decapitado porque não concordava com as estripulias matrimoniais de Henrique VIII. Thomas Morus foi canonizado em 19 de maio de 1935 e virou São Thomas Morus. Orem por ele!
Nada melhor do que essa matança por divergências políticas na ilha e peraltices sexuais dos monarcas para que os ingleses se tornassem mais cautelosos nos séculos seguintes. Religião, política, moral e bons costumes podiam andar juntos, mas não necessariamente nos mesmos parlamentos. E a prudência recomendou pouca discussão e muita obediência às vozes que soavam nos altares.
Em 1717, com a fundação da Maçonaria moderna na ilha, ficou estabelecido que política e religião não se discutissem nas assembleias de homens livres. E James Anderson consagrou o princípio proibitivo nas Constituições, princípio seguido 130 anos mais tarde pelos autores dos Landmarks.
Os maçons franceses não deram a mínima bola para essa questão e discutiram política e religião à vontade. Afinal, há assuntos proibidos para homens livres?
A turbulenta França dos três poderes enunciados por Montesquieu renasceu republicana a partir da iniciação desse filósofo na Maçonaria. Benajmin Franklin (outro maçom que discutia política e religião) esteve nas Lojas da França colhendo subsídios intelectuais e apoio para a Revolução Americana. Voltaire, o maçom mais ilustre da França (e talvez do mundo) discutia sobre tudo e foi “o inventor da tolerância” em política. O mesmo fizeram os Inconfidentes mineiros (pelo menos aqueles comprovadamente iniciados em Portugal, que frequentaram Paris e, de volta ao Brasil, iniciaram “por comunicação” ou “à vista” os novos maçons brasileiros).
O Brasil, que fingia acatar as ordens da Maçonaria inglesa, professou o ideário maçônico francês e discutiu política e religião dentro das Lojas. E foi proclamada a Independência por inspiração dos maçons do Grande Oriente do Brasil.
Ainda hoje, quando vivemos exclusivamente da coragem dos nossos antepassados, contemplamos a República brasileira e constatamos que dez entre os treze primeiros Presidentes foram maçons (Deodoro da Fonseca, Floriano Peixoto, Prudente de Morais, Campos Salles, Rodrigues Alves, Nilo Peçanha, Hermes da Fonseca, Wenceslau Brás, Delfim Moreira e Washington Luís).
Pergunto: as proclamações da Independência e da República foram articuladas nas Lojas sem discussão política? Tivessem eles se limitado à escolha do refrigerante para a festinha semanal e estaríamos até hoje com uma crise de hiperglicemia ou pré-diabéticos.
Bem ou mal, a República aí está – o que falta é coragem e projetos que sustentem aquilo que ajudamos criar 130 anos atrás!
Orem pelo Brasil! E, para usar uma palavrinha que os maçons de hoje adoram: IMPLEMENTEM !
... mas, por favor, não confundam IMPLEMENTAR com aparecer na foto ao lado de políticos.
José Maurício Guimarães
EM TEMPO:
durante a semana em que envio este texto, a CMSB divulgou um ofício encaminhado à Presidência da República abordando importante questão política: o Projeto de Lei n. 7.596/2017, que atualiza a conhecida Lei do Abuso de Autoridade. Parabenizo aos Grão-Mestres das Grandes Lojas brasileiras pela iniciativa. ISSO É AUTÊNTICA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA na defesa dos legítimos interesses nacionais.
Para ler ofício da CMSB encaminhado à Presidência da República, clique no link abaixo.
https://drive.google.com/open?id=1_r23b7firjIWOn1S_7KAaix-05AxR6ts