Liberdade, igualdade, fraternidade e civilização digital

Os tempos modernos sempre foram fonte de medos, relutância ou exaltação, assim como todo progresso técnico se inscreve no pavimento de mosaico para pouco a pouco beneficiar toda a humanidade. Nossos tempos atuais não escapam a essa lógica de confronto entre os “guerreiros dominantes”, os “dominantes pacíficos” e os “dominados exaltados ou tranquilos”.  Nesse início do século XXI, o ideal de fraternidade se encontra enfraquecido, mas os otimistas e humanistas sempre souberam criar harmonia em força e em beleza. O que é ele hoje?

24 de janeiro de 1984.  Uma data que deve ser comemorada todos os anos, porque marca a entrada definitiva do mundo na civilização digital.  Naquele dia, no Pavillon Gabriel dos Champs Élysée, foi apresentada a ferramenta que abriria  todo o extraordinário campo da computação: o Macintosh. Eu nunca vou me esquecer dessa data. Não devido ao orgulho de autor de um evento, mas devido à alegria de ter contribuído para dar a todos a oportunidade de acessar o que estava reservado à elite e aos técnicos. A partir daquela data, como Steve Jobs havia previsto, “todos terão seu computador em casa, na escola, não apenas no escritório”. Na véspera do aniversário destes 35 anos, o “smartphone” móvel, o tablet, o PC “computador pessoal”, os computadores estão na ponta de nossos dedos. Quase simultaneamente, desde março de 1984 foi lançada a primeira rede privada de internet na França chamada Calavados.  Mas já Bill Gates estava na manobra.  A Internet iria se espalhar a uma velocidade sem precedentes no mundo ocidental, em seguida, por toda a terra, com exceção da França congelada no Minitel até a década de 2000.  De agora em diante, a internet está ao alcance de nossos dedos, de nossos olhos e ouvidos e em nossos pensamentos.

Essa breve perspectiva histórica mostra como, em pouco tempo, o ser humano embarcou no caminho de uma nova civilização, não mais local, mas global.  Desnecessário negá-lo, o digital corresponde a uma mudança tão profunda na humanidade quanto o forma a impressão e a eletricidade em sua época. Das profundezas das savanas australianas à Universidade de Xangai, estamos todos conectados neste mundo às vezes científico, virtual e mental. Diante dessa realidade, alguns dizem que “é tudo sobre máquinas e Big Brother, mas a consciência humana não muda”.  Esta declaração merece discussão porque nos 192 países membros das Nações Unidas, além da antiga Atenas ou de Ferney-Voltaire, colocam-se questões tais como respeito ao meio ambiente, à fraternidade ou ao significado religioso.

Os maçons agora são questionados nessa civilização digital, não sobre a mecânica e o uso de ferramentas, mas sim sobre os valores do humanismo que eles trazem há três séculos e mais. O que se tornam a Liberdade – Igualdade – Fraternidade neste novo universo? O que significam esses três valores fundadores diante de determinadas situações? A liberdade de pensar e falar é ou não desafiada pelo fluxo de redes sociais e sites Web? A igualdade de deveres e direitos do ser humano é ou não uma realidade quando um país, o nosso, tem 20% de analfabetos, mas conectados? A fraternidade é uma realidade ou não no universo das redes sociais? Múltiplos assuntos merecem toda a atenção e mobilização dos maçons: ética digital, transumanismo, robotização, comunicação virtual ou o desafio da pobreza no mundo digitalizado.  Da mesma forma, a busca da espiritualidade, especialmente entre as gerações mais jovens, conduz por vezes a posições extremas, até mesmo totalitárias, porque toda espiritualidade transmite uma visão da cidade. “A ciência sem consciência nada mais é do que a ruína da alma”, dizia Rabelais, a quem poderíamos parafrasear: espiritualidade sem ação é apenas uma ilusão. É hora de a Maçonaria tomar a palavra, de reencontrar o centro do debate na cidade no centro da civilização digital.

No dia 5 de novembro, na Assembleia Nacional Francesa, representantes de oito Obediências se reunirão para trazer um olhar maçônico sobre a civilização digital e o humanismo. Os maçons da Federação Francesa do Droit Humain, a Grande Loja da Aliança Maçônica Francesa, a Grande Loja Feminina da França, a Grande Loja da França, a Grande Loja Mista da França, a Grande Loja Mista Universal, a Grande Loja Tradicional e Simbólica Opera e o Grande Oriente de França se apropriam do digital! Esta jornada pretende mostrar como os maçons se engajam no caminho de uma reflexão e de uma ação coletiva para trazer os valores do humanismo à civilização digital. FM&S apresentará uma moção no final da reunião, que será aberta por Jean-Louis Touraine, deputado da Região do Rhône e, em seguida, concluída por Joel de Rosnay e o senador Christophe-André Frassa. Os Grão-Mestres e Dignitários das Obediências falarão durante as três sessões do encontro e dialogarão com especialistas e os participantes.

35 anos atrás, Macintosh abria o caminho para uma nova maneira de viver, mas também de pensar. Hoje, a Maçonaria, fiel à sua dupla vocação de construir o templo e a felicidade da humanidade, mobiliza seus membros e os leigos para que o humano continue sendo a única razão do progresso. Encontrem-se em 5 de novembro!

 

Publicado na Revista FM- FrancMaçonnerie

Bernard Ollagnier

Tradução J. Filardo

Fonte: https://bibliot3ca.com/