Minha amiga afinidade

 

Minha amiga afinidade é uma das pessoas mais adoráveis que você poderá acontecer na vida. Ela nunca avisa quando vai aparecer - dá as caras e desperta um sorriso nas situações mais improváveis. Das poucas pessoas que não bagunçam nossos planos se chegam de supetão. Tão de casa que tem a senha e a chave quando é dia de fazer visita.

 

Ela é rara Omo os cometas que passam pela terra só de vez em quando. Parece resultado de uma química tão peculiar que deveria ser estudada em laboratório por cientistas muito inteligentes e cheios de artigos publicados em revistas com nomes complicados. Ou deveria ser estudada é pelos escritores, que pouco sabem das teorias e tanto sabem das coisas do reino dos sentimentos. Só sei que a afinidade é um fenômeno  dos mais bonitos entre seres bem vivos. E muito me admira que naquele canal que acompanha as caçadas dos leões e os hábitos noturnos das cobras ninguém fale dela.

 

Ela não precisa estar perto. Posso ficar anos sem vê-la. Posso ficar uma eternidade sem saber a quantas ela Ana. Mas quando vejo, é aquela festa. Aquele encontro de semelhanças. Aquele respeito pelas nossas diferenças. Tão surpreendente quanto possível. Tão delicada quanto uma conversa cheia de afeto na mesa da cozinha.

 

Ela combina com seus dias de gargalhada e suas noites de sofrência. Se você não está a fim, ela não aparece. Porque a afinidade tem dessas coisas: ela respeita seu espaço porque sabe sentir empatia. Às vezes, conversamos sem trocar um pio. E nos entendemos  porque olha é perceber o que se passa dentro do outro. 

 

Não foram muitas as vezes em que encontrei a afinidade na vida. Mas sempre foi através de seres bem vivos. Avó. Mãe. Pai. Madrinha. Tio. Prima. Amiga de amiga. Mulher de amigo de marido. No casamento. No feriado na praia. Na casa da tia Romilda. No aniversário que quase deixei de ir. Na casa onde nasci. Lá está afinidade - esse quase amor difícil de descrever.

 

Ah, afinidade, até hoje não consigo explicar você. Um encontro de identidades que nem sempre são iguais. Uma irmã que a gente escolhe. Uma amiga que a gente acolhe. De tão sintonizadas, parece que moramos na mesma estação de rádio. De tão afinadas, quase viramos uma música daquelas bem bonitas de se ouvir para sempre. Onde paramos? Não lembro. Não importa. retomaremos da última conversa e tudo bem. Para a minha amiga afinidade, tempo e separação são palavras que não existem. São coisas que inventamos. São coisas que não combinam. 

 

Ah, afinidade, queira que o mundo inteiro fosse tão afinado nos tons como nos!

 

Thais Ferreira Gattás
thaisferreiragattas@gmail.com

Publicado originalmente em “Notícias do Dia” - Plural.

 

 

Ah, afinidade, até hoje não consigo explicar você. Um encontro de identidades que nem sempre são iguais. Uma irmã que a gente escolhe. Uma amiga que a gente acolhe. De tão sintonizadas, parece que moramos na mesma estação de rádio.