Na era da razão, por que nos tornamos tão irracionais?

Nasci e vivo em uma era que jurou ter matado Deus e elevado a racionalidade, todavia, não me parece ser assim.

“Deus está morto”, disse Friedrich Nietzsche ao sugerir que, daquele momento em diante, a humanidade poderia confiar tão somente na razão, abandonando a irracionalidade da religião e dos mitos. A partir deste momento vimos o positivismo ganhar ares de verdade indiscutível e teorias estritamente científicas darem seus saltos no salão da modernidade; daquele momento em diante — momento que foi preparado pela revolução Francesa e pelo iluminismo — não correríamos mais o risco de sermos gados conduzidos ao matadouro nem de nos entorpecermos com o “ópio do povo”. A razão venceu. Certo? Errado.

A modernidade apenas substituiu os dogmas, e na ânsia de serem livres criaram novas cadeias, só que, agora, estas vinham com frases revolucionárias, textos utópicos e poderes aquisitivos astronômicos que davam a grande sensação de liberdade, mesmo que entre grades. Suspeito que a modernidade quis colocar-se em liberdade, mas confiou nos discursos errados. Abolindo Deus, os homens não o mataram, apenas tentaram colocar-se em seu lugar, o que foi caótico para a própria razão, diga-se de passagem.

A modernidade padece da falta de alta cultura, e, quando os grandes pensadores são ignorados, acabamos fazendo um processo de inversão doentia, colocando os tolos nos tronos dos grandes e os grandes nos postos dos tolos. Qualquer frase de facebook vira a mais alta filosofia; teorias com as mais mirabolantes afirmações — sem fundamento algum — tornam-se o mais alto discurso universitário; jargões, que, per se, são os sintomas mais reluzentes de uma demência intelectual, se vociferam pelos discursos pseudointelectuais de nossos pseudosintelectuais. Não é raro vermos atualmente uma juventude universitária que clama para si a missão divina de revolucionar a sociedade, o que é típico da juventude é verdade. Entretanto, o grande problema é que os jovens nem sequer sabem o que defendem, apenas repetem, repetem e repetem discursos em um processo histérico e irrefletido. Discursos revolucionários ditos por seus sacerdotes/professores/revolucionários tornam-se leis. Praticamente em todos os cursos do ensino universitário público e particular se encontram paladinos incumbidos de trazerem a igualdade mundial.

Na realidade é um verdadeiro caso de demência coletiva, se fizermos uma pesquisa entre os universitários que se dizem socialistas, questionando-os sobre as leituras das obras de Karl Marx, Gramsci, Bernard Shaw, Paulo Freire, Lênin, entre outros, assustaríamos com o analfabetismo funcional que rodeiam os jovens ditos socialistas que nunca estudaram nada sobre o socialismo, vivem de discursos de terceiros e, com a mais tenra autoridade de intelectuais e doutos livres pensadores, acusam cristãos de serem dogmáticos, fanáticos e irracionais, sendo que, ao final destas acusações eles voltarão para seus facebook’s para repetir, sem refletir, até a exaustão aquilo que aprenderam na “aula de revolução”. Estes intrépidos racionalistas defendem, com certa agudeza, a manutenção da vida de uma árvore enquanto repetem discursos de Che Guevara, um genocida de dar orgulho a Stalin; choram a morte de uma tartaruga enquanto clamam pelo direito de abortar um feto humano; defendem a liberação das drogas como medida de saúde pública, sem nunca, é claro, ter passeado pela linda e suntuosa crackolândia; e, mais recentemente, cultuam a doentia, infundada e irracional ideia que o sexo é uma construção social e não um fato naturalmente dado, que nossos órgãos genitais são um mero acaso natural, que eles nada dizem sobre nossa condição físico-psíquica. Simone Goyard-Fabre disse, ao comentar Raymond Aron: “O marxismo foi o ópio dos intelectuais de esquerda”[1]; isto explicaria o fato de haver tantos doutores com ideias tão pífias.

Na obra fictícia de George Orwell, 1984, obra esta que é extremamente pertinente ao nosso tempo, ele mostra-nos como se faz para bestializar uma sociedade inteira. Basicamente precisamos de três coisas: (1) modificar o passado ou apaga-lo; (2) mudar a semântica das palavras que conceituam as bases éticas e morais da sociedade; e, por fim, (3) ter controle absoluto dos meios políticos e educacionais.

1- Modificar o passado: quem aqui aprendeu no ensino médio sobre os terrores causados pelo comunismo? Quem aqui ouviu um professor solenemente proferir algum comentário sobre os fuzilamentos em massa feitos por Fidel Castro? Quem aqui ouviu, apenas de passagem, um professor de história descrever os meios revolucionário sanguinários utilizados por Che Guevara? Agora, quantos ouviram sobre as maravilhas da sociedade igualitária cubana? Sobre a coragem e heroísmo de Che?

2- Modificar a semântica: atualmente há uma briga na câmara dos deputados para a definição formal do conceito “família”, o que é um tanto quanto ridículo, seja qual definição for escolhida. É ridículo , pois o Estado não possui competência e nem poder para tal definição, a família, tal como é (pai + mãe + prole [ou abertura natural para a prole]), é algo anterior ao Estado, em termos mais diretos: existe Estado porque antes houve uma célula social chamada família, não o contrário: há família porque antes houve Estado. As famílias são “uma necessidade da humanidade[...] um alçapão do qual a humanidade não tem como escapar”[2]. Todavia, hoje, por definição jurídica, querem mudar um conceito que não lhes cabem mudar, que não detém poder para tal, podem até mudar a hermenêutica da palavra “família” por via jurídica, mas nunca mudarão sua definição real, basal e verdadeira em relação ao direito natural sobre o que família é.

O mesmo ocorre com a palavra “gênero” que, antes usava-se para definir diferenças de coletividades, agora usa-se para a definição sexual-cultural, pois, gênero, segundo os novos moldes semânticos, refere-se a escolha social do “sexo”; o mesmo ocorre com a terminologia de “A e O” que se referia ao sexo natural de alguém a qual a terminologia se refere, agora está sendo trocada por “X” para justificar a escolha “cultural” do sexo arbitrário, como acima foi explicado, por exemplo, ao invés de “ALUNO(A)” utiliza-se “ALUNX”, como se o aluno(a) fosse uma espécie de ser amorfo (ou melhor, “amorfx); todos estes casos são anteriores a constituição de qualquer Estado ou sociedade organizada, antes de haver normas jurídicas ou constituições, já havia diferenciações sexuais entre macho e fêmea, já havia famílias estruturadas em macho, fêmea e sua prole, mesmo que Marx e Rousseau discordem, já que, pelo que eu saiba, ambos foram casados com pessoas do sexo oposto e tiveram uma prole.

3- Controle absoluto: ora, se possuem o poder de definir o que é família, de definir como devemos educar nossos filhos (quem deu o direito ao Estado de educar sexualmente meus filhos?), definir aquilo que nossos filhos são (sexualmente, ou melhor dizendo “genericamente”), o que falta mais para o Estado obter o controle absoluto? Se eles já adentraram a nossos lares via enculturação marxista, impondo-nos aquilo que eles acham ser família, impondo a nossos filhos aquilo que eles acham que eles são. Isto é liberdade?

Não matamos Deus. Pois, primeiramente, ele é anterior a nossa razão — assim como família é anterior ao Estado —, então desçam do salto caros socialistas/liberais ateus, sua razão não pode matar quem a criou. Mas, perguntemo-nos: que racionalidade é esta? Antes acreditávamos na não definição sexual, sim, mas as dos anjos; acreditávamos sim nas mudanças, mas nas mudanças perenes e contínuas e não em revoluções desconexas guiadas por teorias infundadas, por paixões burras; acreditávamos sim no poder absoluto, mas num poder absoluto no campo divino, que possuía total primazia sim, mas no campo moral pessoal. Acreditávamos sim em um mundo melhor, igual e justo, mas isto em um campo escatológico; não alimentávamos utopias que se agigantam à custa de sangue humano, como uma esponja cresce sugando água suja.

Os tolos acreditaram que mataram Deus, nada fizeram a ele, apenas transferiram suas esperanças de um campo transcendente para um imanente, esquecendo-se de salientar que, aqui ninguém possuí onipotência e nem há eternidades, aqui os seres humanos continuam sendo falhos e sedentos por poder, guiados constantemente por ideologias enfadonhas e que, crendo eles poderem ser como Deus, apenas transformaram-se em tiranos. Esta é a era da razão?

Referências:

[1] GOYARD-FABRE, Simone. O que é democracia?. 1ºEd, Martins Fontes: São Paulo, 2003. p. 246

[2]CHESTERTON, G. K. O que há de errado com o mundo, 1ª Ed, Ecclesiae: Campinas SP, 2013. P. 56

 

Pedro Henrique Alves
"Alguém que jamais dirá algo somente para agradar, que não foge da verdade e tem como prioridade: seus valores"! Por: Daiana Teixeira.
                                                                               

 

 

 

 

 

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