Não fale, apenas ouça!

Devemos aprender e reaprender a atenção plena: o ouvir sem qualquer pensamento e necessidade de resposta.


 

Mesmo que tenhamos a melhor das intenções, sempre que vamos ouvir alguém, automaticamente já elaboramos a resposta quando a pessoa ainda está falando e às vezes vagarosamente, tomando a coragem necessária para se abrir. Por exemplo, um amigo chega e quer falar sobre os problemas de seu relacionamento. Enquanto ele começa a falar, já fazemos uma conexão sobre o que o ele está contando com nossas próprias experiências. Antes do final do relato é provável que já tenhamos as opiniões formadas e os conselhos prontos para aquele caso. Temos um cérebro que nunca para, um turbilhão de pensamentos que não conseguimos controlar a todo instante. Acabamos sendo controlados por esse pensar incessante. E não por maldade ou falta de interesse, não nos permitimos ouvir o “outro” quando ele mais precisa. E no final temos esse comportamento até mesmo com os que mais amamos e desejamos ouvir.

Devemos aprender e reaprender a atenção plena: o ouvir sem qualquer pensamento e necessidade de resposta. Mais vale solicitar que nosso amigo repita suas palavras, para que tenhamos uma segunda e terceira chance de ouvi-lo com toda atenção, do que nos perdermos em nossas memórias automáticas. É um exercício de sabedoria, paciência e amor. Na maior parte do tempo quando temos uma tristeza ou dificuldade, o que mais nos ajuda é ter alguém para nos ouvir com todo cuidado, amor e atenção. Nem sempre queremos uma resposta ou uma opinião. Somente queremos o ombro amigo que nos ouve incansavelmente, sem julgamentos ou interrupções. Meu filho recentemente me disse: “Você escuta, você até fica em silêncio, mas entende o que eu digo baseada em suas experiências e não no que eu estou dizendo e no que estou sentindo”. Ele tinha razão. E por mais que me doesse essa constatação, sua verdade me deu a chance de repensar a minha forma de ouvir. Exercício para todas as vezes seguintes, seja com ele ou seja com quem for.

Se alguém viesse me falar de uma gravidez precoce até então, eu automaticamente sentiria pena, pois a informação me remeteria a minha própria experiência, que foi de dor e dificuldade na época. Outro exemplo: se viessem me falar de um intercâmbio na Europa, eu também receberia a conversa como algo difícil e negativo, pois assim foi o que eu vivenciei a maior parte do tempo. Mas temos que aprender de uma vez por todas, que por mais que todas as estatísticas demonstrem que uma situação é “assim” ou “assado”, ainda assim, trata-se de uma nova história e a mesma poderá ser diferente para aquela outra pessoa. Além do que, cada um tem o direito, e muitas vezes, a necessidade de passar por aquela experiência por ela mesma.

Hoje quando alguém fala comigo, eu simplesmente tento não pensar. Se me recordo imediatamente de alguma história minha, que parece a mesma coisa que esta pessoa me fala, eu me obrigo a esquecer. E foco na história daquele que me fala, tento apenas sentir o que esta pessoa sente e me colocar no lugar dela. Permaneço o máximo de tempo em silêncio, em conexão com a pessoa e não comigo mesma. Nem sempre é fácil, mas acredito ser a melhor maneira de ouvir de verdade. Como meu filho me disse, eu até ouvia em silêncio, mas não entendia suas palavras do ponto de vista dele. E para que eu não perca mais a possibilidade de ouvir as pessoas que mais amo nesta vida, me coloquei à disposição desta permanente lição: ouvir sem falar, ouvir sem pensar. E ouvir sentindo!

CAROLINA VILA NOVA

É autora dos seguintes livros: "Minha vida na Alemanha" (Biografia), "A dor de Joana" (Romance-drama), "Carolina nua" (Crônicas), "Carolina nua outra vez" (Crônicas), "Vamos vida, me surpreenda!" (Crônicas), "As várias mortes de Amanda" (Romance-drama), "O dia em que os gatos andaram de avião" (Infantil) e "O milagre da vida" (Crônicas). Todos disponíveis no site www.amazon.com e www.amazon.com.br Mais matérias e informações em: www.carolinavilanova.com.

 

 

 


 

 

 

 

 

 

publicado em sociedade por Carolina Vila Nova.