O TEMPLO DE SALOMÃO: UM PALÁCIO EGÍPCIO

INTRODUÇÃO

            Até o século 19, vários ocultistas impressionavam multidões com alegações fantásticas sobre as supostas origens no Egito antigo de várias ordens iniciáticas, inclusive da Maçonaria. Tudo isso mudou bastante quando Champollion interpretou a Pedra de Rosetta, no século 19, e a maioria dessas alegações se provou infundada.

            Contudo, há uma conexão extraordinária e bastante real entre a Maçonaria e o Egito antigo que permanece desconhecida da maioria dos maçons. E ela ocorre através de algo que está no centro das lendas maçônicas: o Templo de Salomão.

            O que pouca gente sabe é que o Templo de Salomão era, em sua arquitetura, uma réplica de um palácio egípcio.

O QUE ERAM OS TEMPLOS

            Para entender melhor isso, é preciso primeiramente considerar que os templos no antigo Oriente Médio não eram locais de culto, como se pensa o termo hoje. Os templos eram, literalmente, considerados como casas das divindades.

            Literalmente porque os povos meso-orientais da antiguidade entendiam que os deuses visitavam os templos para descansar, para comer e para ali habitar. Razão pela qual havia uma série de regulamentações, que podem ser vistas na própria Bíblia inclusive, sobre higiene, limpeza do local, e até mesmo que tipos de refeições seriam oferecidas às divindades.

            Por exemplo, compare este antigo texto cananeu, com uma passagem bíblica a seguir: 

            “Quem faz algo de uma maneira impura e oferece ao rei água poluída, derramai vós, ó deuses, a alma daquele homem como água!” (Ancient Near Eastern Texts Relating to the Old Testament – Instructions for Palace Personnel to Insure the King’s Purity)

            “Assim separareis os filhos de Israel das suas imundícias, para que não morram nas suas imundícias, contaminando o meu tabernáculo, que está no meio deles.” (Levítico 15:33)

            Ou ainda observe como os israelitas serviam comida diante dos aposentos de Deus (i.e. o Santo dos Santos) continuamente:

            “E sobre a mesa porás o pão da proposição perante a minha face perpetuamente.” (Êxodo 25:30)

            Enfim, há inúmeros exemplos, mas não serão abordados aqui para não desfiar o foco. O importante é apenas familiarizar o leitor com o conceito de que o templo era tido literalmente como a casa da divindade.

AS ORIGENS DO TEMPLO DE SALOMÃO

            O Monoteísmo do Reino de Judá, onde se situava o Templo de Salomão, se desenvolveu a partir de seu vizinho, Midiã. Isso é dito explicitamente na Bíblia:

            “E apascentava Moisés o rebanho de Jetro, seu sogro, sacerdote em Midiã; e levou o rebanho atrás do deserto, e chegou ao monte de Deus, a Horebe.” (Êxodo 3:1)

            Isso é importante porque Midiã era uma confederação de tribos nômades que havia se libertado, tempos antes, da dominação egípcia.

            Registros arqueológicos mostram que Midiã havia não apenas feito tal movimento, como também havia convertido templos egípcios em templos monoteístas, direcionados à sua divindade. 

            Considerando, portanto, que Judá era herdeiro dessa cultura, além do fato do Egito ter por diversas vezes dominado cultural e economicamente a região de Canaã, não surpreende que essas semelhanças sejam encontradas.

            Na imagem abaixo, um templo egípcio erigido a Hator, deusa primordial egípcia, datando do século 12 a.c., na região de Timná, em Israel. 

 

            Alguns registros em cerâmica mostram que os midianitas posteriormente converteram tal templo num local de culto à sua própria divindade.

Uma observação mais atenta revela exatamente a mesma estrutura do Templo de Salomão: Um átrio, onde profanos teriam livre acesso; um santo lugar, onde somente sacerdotes poderiam adentrar; e, por fim, um pequeno santo dos santos, considerado o aposento principal da divindade, onde estaria algum objeto que a representasse.

            Como dito anteriormente, templos eram tido como lares para as divindades, literalmente falando. Acreditava-se que a presença da divindade, agradada pelo serviço de seus fiéis, traria bênçãos à região.

UM PALÁCIO PARA A DIVINDADE

            E, se você pretende construir uma habitação (literal) para uma divindade, nada mais natural que ela seja espelhada nos moldes arquitetônicos das habitações dos reis região. E isso nos leva a outra premissa importante.

            Felizmente, a Arqueologia também nos ajuda a compreender como eram as tendas egípcias que os faraós utilizavam justamente nas batalhas onde conquistaram tais territórios, ou ainda em suas visitas à região.

            Abaixo, achado arqueológico retratando o acampamento de Ramsés II na batalha de Qadesh, descoberto em Luxor, no Egito:

 

Observe como no centro, a tenda de Ramsés II também segue o modelo triparticionado, contendo um átrio, um local interior e os aposentos do rei. Isso fica ainda mais claro nos achados em Abu Simbel, na fronteira do Egito com o Sudão, representando o mesmo evento:

 

Como se pode perceber, até mesmo os querubins que adornavam as cortinas do Santo dos Santos, bem como a tampa da Arca da Aliança – seres que eram vistos como “guardas” de lugares mais sagrados – estão presentes.

            Agora compare com o modelo do Tabernáculo de Moisés recebido por ele no monte Horebe, território de Midiã:

 

Por fim, compare com o Templo de Salomão, cuja arquitetura se propunha essencialmente a ser uma versão permanente do Tabernáculo:

Como se pode perceber, o Templo de Salomão é, essencialmente, um templo egípcio. E os templos egípcios na região de Canaã eram baseados na estrutura das habitações das tendas dos faraós. 

            Assim sendo, pode-se dizer que existe de fato uma conexão real entre a Maçonaria e o antigo Egito através das lendas do Templo. Sem, para isso, cair nas ideias fantasiosas que permearam os séculos anteriores.

            Por fim, convido o leitor a refletir: Como o fato do Templo de Salomão ser essencialmente um palácio real, nos moldes egípcios, impactaria o nosso entendimento de seus elementos e símbolos?

Bibliografia

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Luis Felipe Moura 

é M∴ M∴, membro da ARLS∴ Conde de Grasse-Tilly 301 (Grande Oriente Paulista/COMAB). É bacharel em Letras (inglês), mestre em Teologia e em Psicanálise, atualmente trabalha como psicanalista e professor de Bíblia Hebraica.

Publicado no Blog: https://www.oprumodehiram.com.br/