Pensemos...

Muitas vezes escuto uma frase que causa certo desconforto: “acho que o fulano tem perfil para Maçom”. Em primeiro lugar, o “acho” é uma incerteza revestida de suposição. E, sendo o ser humano movido pelo cérebro, mas motivado através do sentimento, tal colocação é invariavelmente fruto de uma hipótese que apenas insistimos em otimizar.

Antes de “acharmos” se um profano possui condições de ser indicado, devemos levar em conta uma série de reflexões. A começar por nós mesmos, os que indicam. E para isso não existe cartilha, pois está semeado no fértil solo do nosso bom senso e sustentado pelo incansável aprendizado que, ao longo da nossa caminhada dentro da Ordem, recebemos como ensinamento.

Sabedores da natureza da Maçonaria como ciência iniciática, filosófica, filantrópica e evolucionista, devemos buscar uma base
consistente para tentar identificar aquele que possui real afinidade com os nossos propósitos para compartilhar da inefável missão, tendo por princípio inquestionável a crença na existência de um SER SUPERIOR.

Não quero dizer aqui que somos perfeitos e detentores de exemplos infalíveis. Jamais. Tanto que afirmamos ser a Maçonaria perfeita, mas o Maçom não. Porém, estamos alertas e permanentemente dispostos no sentido da lapidarmos a nossa pedra bruta num estado de incessante aprimoramento. E a indicação criteriosa de um profano nos dá ciência da
nossa responsabilidade como Maçom e nos sinaliza para a seriedade com que devemos atuar junto à Maçonaria.

O fato de alguém ser correto não é o suficiente para consideramos apto no sentido de ocupar as nossas colunas e nem de compartilhar dos nossos mistérios. Ora, ser correto é uma obrigação do ser humano e não uma virtude. É preciso que possamos aprofundar mais a nossa intenção. A indicação por impulso é um exemplo, pois deve ser prontamente descartada.

Entendo que não podemos ter pressa. Dar tempo ao tempo, através de muita convivência com o candidato, observando com zelo e dedicação o seu comportamento isento de qualquer paternalismo. Seja no campo profissional, familiar ou social. 

Penso também que, o fato do postulante preencher positivamente todos os requisitos de uma sindicância não é o suficiente, embora seja um bom caminho andado. Mas, para isso, antes é fundamental que aqueles que indicam mergulhem com profundidade na difícil tarefa, da mesma forma que os membros da Loja não se omitam, acalentando o receio de expor o que
pensam pelo o temor de ferir aquele que indicou.

Afinal, a Maçonaria não é um reformatório. A Maçonaria não ensina, nós sim é que aprendemos com ela. É claro que, para isso, precisamos possuir um terreno fértil, disposto ao estudo com muita dedicação e estarmos abertos aos valores que nos conduzem na tão almejada evolução. Não raras vezes conhecemos um Maçom muito mais pela sua conduta no mundo profano do que dentro de uma Loja. Alicerçados pelos princípios de sermos livres e de bons costumes é nossa obrigação e competência um verdadeiro comprometimento com a nossa evolução voltada para o bem da humanidade.

Porém, mesmo em face do que entendemos ser indispensável para alguém se tornar membro da Ordem, antes é necessário um seletivo e criterioso rigor de quem indica. 

O mesmo acontece com as sindicâncias, uma vez que, não podem se ater somente a uma folha de papel a ser
preenchida com os dados obtidos, muitas vezes de forma distante e quase impessoal. Ora, a Maçonaria não é uma empresa que seleciona candidatos e depois contrata, entendendo que, caso um dia não correspondam ao esperado, podem ser dispensados com perplexa naturalidade. Uma vez Maçom, Maçom permanece.

Na minha visão, muitas vezes comparo a Maçonaria com uma orquestra. Um músico que não se adapta e constantemente desafina, propaga a dissonância e inibe a beleza da música. O dano acaba se tornando marcante. Caso o instrumentista não esteja disposto a se aprimorar para alcançar uma afinação perfeita, a interpretar o que contém na partitura e acolher os comandos do maestro,

indiscutivelmente semeará uma desarmonia irremediável devido à desafinação causada. Por acaso já não presenciamos situações assim?

Outro fato muito delicado são as indicações por interesses escusos. Tal fato deve ser banido de forma inquestionável.
Acontece que Maçonaria não é um balcão de negócios: quando alguém é convidado apenas pela intenção de trazer para o seu meio um membro que possa proporcionar benefícios particulares.

Somos uma Irmandade. Somos Fraternos. O nosso objetivo está muito distante do plano individual. Ultrapassa as fronteiras do nosso “eu” e visa atingir o bem comum, exercendo com fundamental dedicação uma ilimitada importância coletiva, pois temos como missão primordial a inefável honra de sermos mensageiros do Grande Arquiteto do Universo. E, aquele que não conseguir entender tão bela tarefa, com certeza será apenas alguém que usa avental e frequenta um Templo,
porém jamais pulsará dentro do seu peito o coração de um verdadeiro Maçom.

Com o passar dos anos trabalhando de forma incessante e dedicada à Ordem, através de muita meditação e reflexão, vamos desenvolvendo uma intuição criteriosa e, talvez, aguçada. É evidente que não existe mágica nem possuímos uma bola de cristal, mas a experiência nos ensina. Não raras vezes, nos primeiros contatos com um novo Aprendiz já podemos deduzir se ele será ou não um real obreiro, capaz de erguer tijolo por tijolo na construção da sua edificação, e, em caso negativo, nos faz lamentar com aquela frase muitas vezes pronunciada: “culpa das más indicações”.

Devemos sempre observar se o candidato possui um comportamento com impecável humildade, capaz de reconhecer que é passível de errar. E diante dessa constatação buscar corrigi-lo, ou seja, conviver intimamente com a própria consciência. Uma vez ciente dos seus atos, reconhecer que isso só é possível com acentuada prática da autocrítica, a real e verdadeira mea culpa. Somente assim entenderá que a sua edificação interior é uma resposta do seu próprio eu, quando disposta aos ensinamentos que lhe proporcionarão o crescimento tão sonhado.

A maçonaria ultrapassa as fronteiras do tempo. E a nós compete a missão de semearmos a sua inefável grandiosidade.
Somente assim, no silêncio do nosso íntimo, com paz na consciência, será possível dizer: MM.´.I.´.C.´.T.´.R.´.R.´..

Norberto Pardelhas de Barcellos
Loja Resistência Nº 536
Or.´. Porto Alegre RS