Qual é, afinal, a tua obra?

Meu pai sempre teve o feliz hábito de me presentear com livros de acordo com alguma circunstância específica que eu estivesse vivendo. A primeira vez que meu coração foi partido, por exemplo, ele me presenteou com a coleção inteira do filósofo inglês Allain de Botton, sobre o amor

 

Alguns meses depois, em uma conversa casual de domingo, desabafei sobre uma semana difícil e ele arrancou do porta-luvas uma cópia surrada de “Um dia daqueles”, do Bradley Trevor. Essa é, desde os primórdios, sua forma de me oferecer amparo.

 

No começo da semana havíamos debatido por horas sobre a pequenice da nossa existência. Então, pelas minhas contas, era questão de tempo até ele encontrar o livro certo para me confortar. Quando essa hora chegou, rasguei o embrulho do presente previsível com a avidez de uma criança em véspera de Natal.

O título embaralhado, contudo, não trouxe uma resposta às minhas inquietações; trouxe uma nova indagação: Qual é a tua obra?

Por Deus! Eu buscava uma solução e não uma nova provocativa. Apesar disso, devorei o livreto do sempre genial Professor Mário Sérgio Cortella e fui tomada por um sentimento incontrolável de fazer ao mundo um convite à leitura deste.

Pra quem não sabe — assim como eu não sabia -, a palavra “obra” vem do latim (ópera) e significa “aquilo que eu faço e também aquilo que me faz”. Eu não sei quanto a vocês, mas quando eu penso na minha obra, eu penso no meu trabalho. E se o meu trabalho é aquilo que me faz, não ser quem eu sou é entrar em direta dissonância com este.

Perceber-se na sua criação e observar a relação de causa e efeito que existe em tudo o que fazemos é, talvez, a chave para uma rotina feliz e próspera nos ambientes pelos quais fluímos. Porque não sendo reconhecido por aquilo que produz, o indivíduo permanece alheio aos resultados do seu esforço e desenvolve, portanto, um dos maiores traumas corporativos atuais: a sensação de não pertencimento.

E nem preciso dizer que esse sentimento desencadeia um desconforto que compromete não somente a busca por um significado, mas também os resultados, a produtividade e desempenho de um profissional.

 

Ao fim das contas, o que me parece é que existe — ou deveria existir! — uma urgência crônica em ressaltar a obra coletiva e encontrar um propósito na nossa própria. Como diz Cortella, nos especializamos nos "comos" e deixamos de lado os "porquês". Saber como se faz, pode mostrar que você é a pessoa certa para o trabalho. Mas é saber o porquê se faz que irá te mostra se o trabalho é certo para você.   

Mariana Craveiro