Que Maçonaria queremos?
“Perca com classe, vença com ousadia, porque o mundo pertence a quem se atreve.”
Essa frase, atribuída a Charles Chaplin, é representativa das inquietudes que me movem a fazer a pergunta do título.
Grandes decisões de hoje para aspirarem à sabedoria, precisam se espelhar na experiência histórica. A instituição da nossa Maçonaria, nos moldes que a conhecemos hoje, foi gestada num país que agasalhava um conflito religioso há pelo menos dois séculos e ainda não havia sarado dos períodos turbulentos na sucessão de seus monarcas. Naquele momento, nada mais adequado e universal do que instituir-se com a proclamação da não-discriminação e mantendo fora do ambiente maçônico toda discussão de ordem político-partidária e religiosa.
A Maçonaria de raiz britânica se manteve mais fiel a esses postulados, por isso, sendo geralmente tida por conservadora. Na França, onde a Maçonaria aportou poucas décadas depois, quiçá pelo sangue latino de seu povo, a Irmandade tomou outro rumo. Não só se debatia política, como é notório que Maçons foram protagonistas dos movimentos revolucionários e culturais que marcaram a história não só da França, mas de toda a humanidade. Esse mesmo protagonismo se verificou em nosso Brasil, nas principais guinadas políticas como a Independência e a República, e nas socioculturais, como na abolição da escravatura.
Chegamos ao século XXI com a Maçonaria sem o fulgor desse protagonismo e, pior, em notável esmaecimento de sua relevância social, que traz como uma das consequências a perda de membros e a incipiente procura por candidatos jovens e bens instruídos. Os que nela permanecem se contentam em ficar encasulados em seus templos, repetindo os rituais e proclamando uma evolução pessoal centrada na famosa exortação Socrática “conhece-te a ti mesmo”.
Ocorre que um dos postulados da Psicologia nos ensina que não se supera aquilo que não se enfrenta. Para conhecer-se, para além do diagnóstico dos pontos que merecem mudança, é mais relevante o enfrentamento das deficiências para poder superá-las.
Ora, nos proclamamos como uma categoria de cidadãos esclarecidos e de bons princípios morais. Isso nos exige, pelo menos, as virtudes de saber ouvir, respeitar, tolerar as opiniões ou ideias, mesmo que contrárias às nossas. Desse modo, estabelecer como tabus a evitação dos debates de temas políticos nos deixa na posição do avestruz que, para evitar o perigo, dele não foge nem o enfrenta, mas simplesmente enterra a cabeça na areia numa vã estratégia de sobrevivência. Mais; se como cidadãos esclarecidos não contribuímos para o debate e, por consequência para o aperfeiçoamento das ideias, significa que não amadurecemos não só em termos de consciência cívica, mas nos quedamos estacionados na missão do autoconhecimento.
É inegável que vivemos quadra histórica de polaridade acendrada. E, também entre nós, existem irmãos de posições situadas nos extremos do espectro político ideológico. Mas isto não é motivo bastante para ter como tabus os temas ditos polêmicos. É imaginável uma escola ou academia de filosofia onde certos assuntos sejam proibidos? E, ante essa sombria realidade é de se perguntar qual a nossa relevância social, cívica e cultural? Satisfaz nossos anseios mais recônditos pertencer a uma instituição medrosa que prefere ficar em cima do muro a assumir uma posição?
Lembremos da advertência de Dante Alighieri:
“No inferno os lugares mais quentes são reservados àqueles que escolheram a neutralidade em tempo de crise.”
O mundo de hoje prima pela objetividade, por efetividade, eficiência e eficácia. Ora, nem se trata de aspirar um retorno ao protagonismo político de outrora, vez que hoje o ambiente sociopolítico não é para amadores. Mas evitar a discussão deste ao daquele tema, me parece estagnação, para não dizer retrocesso. Dante nos previne contra a omissão – mascarada de neutralidade -, Chaplin nos convida à ousadia, ao atrevimento (no bom sentido).
Qual será a nossa escolha?
José Darci Pereira Morsch Soares
Mestre Maçom da Loja "Progresso e Fraternidade" Nº 222, Oriente de Porto Alegre, jurisdicionada à GLEMERS.
Publicado no Blog: https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/