Reflexão sobre Espiritualização, Orgulho e Ilusão

 

As palavras do título podem ser consideradas deslocadas mas, na verdade, refletem o que se pode observar em muitos textos postados em nossos grupos de WhatsApp.

Aqueles de nós que se interessam pelos aspectos transcendentais do mundo e da existência humana, acabam por tornar-se vulneráveis a uma armadilha. 

Ao tomar contato com conceitos e descrições de aspectos místicos da composição do Ser e do Universo, é comum a tendência de considerar-se detentor de um conhecimento destinado a poucos, participando assim da casta dos “Verdadeiros Iniciados”. Essa consideração, geralmente é acompanhada de certo menosprezo por aqueles que não alcançaram ainda essa condição. Porém, na verdade, quando se fala em “Conhecimento Esotérico”, na maioria quase absoluta dos casos, se quer referir à crença na correspondência dos conceitos e descrições de determinados autores com o mundo real. É necessário fazer-se o seguinte questionamento: 

O que, de fato adquiri? 

Tenho, realmente “conhecimento”? 

Cito como exemplo os bastante divulgados conceitos e descrições vindos do hinduísmo, dos “Chakras”, centros psico/energéticos que seriam ativado pela energia Kundalini, descendo pelo canal espinhal sushumna, acumulando-se no chakra base muladhara, no sacro, e subindo espiralando em torno da coluna pelos dois “Nadis”, “Ida” e “Pingala”, enquanto o indivíduo evolui em sua espiritualização. Isto pode ser considerado “Conhecimento? 

Sabemos, de fato, que é assim com relação aos chakras, somos capazes de “Ver” ou experimentar sua realidade e efeitos, ou simplesmente nos deixamos convencer pela plausibilidade das explicações dos autores que lemos? 

No primeiro caso, teríamos conhecimento, no segundo, apenas crença. É comum encontrar-se um jorro de conceitos derivados da Teosofia, Rosacrucianismo, Cabala, Hermetismo em geral, associados à Maçonaria, como se constituíssem um “conhecimento” mais elevado, reservado apenas aos maçons, mais dedicados, profundos e espiritualizados. Eis aí o “orgulho” do título. 

Em geral, seus autores estão apenas transcrevendo conceitos e descrições que leram. Nunca tiveram oportunidade ou condição de experimentar a realidade dos conceitos e descrições que apresentam, apenas acreditam que eles são reais, e consideram-se elevados, especiais, por terem entrado em contato com essas ideias, cultivarem essas crenças e olham com certa condescendência superior para aqueles que ainda “Não alcançaram esse conhecimento”. Isso me lembra o que diz um dos autores do livro “O Despertar dos Mágicos”, Louis Pawels, que escreve o prefácio de seu livro escrito em parceria com Jacques Bergier, ao se referir às suas experiência de estudos esotéricos com o famoso místico armênio Georgiǐ Ivanovič Gǐurdžiev:

“Esforçava-me por me separar das minhas emoções, dos meus sentimentos, dos meus impulsos, a fim de encontrar, para além, qualquer coisa de imóvel e permanente, uma presença muda, anônima, transcendente, que me consolaria da minha pequena realidade e da incongruência do mundo. (...) Supunha possuir os segredos do governo do espírito e de todo o conhecimento. Na verdade, eu não possuía mais que a ilusão de possuir e um enorme desprezo por aqueles que não partilhavam dessa ilusão”1. (o grifo é meu).
 

Aqui entra a “Ilusão” do título. Cada um de nós, que busca o conhecimento e contato com o transcendente, precisa, em algum momento, se questionar a respeito de sua real condição. Possui, de fato algum conheci- mento, experiência, sabe que é verdade aquilo que diz, ou, simplesmente repete o que leu? Ou, quem sabe, “Possui apenas a ilusão de possuir, e despreza aqueles que não compartilham dessa ilusão”? 

Examine-se cada um a si mesmo, com sinceridade, “sem sofisma nem reserva mental”, e tire suas próprias conclusões.

Eleutério Nicolau da Conceição

Membro da Loja "Alferes Tiradentes" Nº 20

Florianópolis - Santa Catarina - Brasil

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Louis Pawels e Jacques Bergier, O Despertar dos Mágicos,São Paulo, Difusão Européia do Livro, 1972, p. 10.