Ser Maçom

 

Este caso aconteceu no início deste ano. Fiz algumas viagens a capital do Rio Grande do Norte, para tratar de assuntos pessoais. Na ocasião recém ingresso na ordem maçônica, lendo muito sobre a história leis e regulamentos, e já apaixonado pelos seus princípios doutrinários e filosóficos, fui convidado por meu cunhado para ir a uma festa de aniversário na residência de um amigo, que tinha um irmão maçom. Não recusei. Até comprei um presente para o “desconhecido” aniversariante, pois não queria chegar em sua casa, com as mãos abanando. Pra ele levei o livro “O MONGE E O EXECUTIVO”, de JAMES C. HUNTER, que trata da essência da liderança, abordando temas de extrema importância para quem convive com pessoas de pensamentos mais diversos e pretende entender a natureza humana e se fazer entendido.

Ao chegar à casa do aniversariante fui apresentado por meu cunhado, pedi desculpa por ter chegado sem ser convidado e lhe presenteei o livro justificando o porquê daquele presente. O aniversariante falou que nunca havia recebido livros de presente, e demonstrando gratidão pelo meu gesto falou que iria ler e entraria em contato comigo para fazer algum comentário sobre a leitura.

A festa estava bastante animada, regada com muita bebida, frutos de mar, churrasco e pagode.

Próximo do final da festa o aniversariante, de pileque, se aproximou de mim e começamos a conversar sobre diversos assuntos. Ele me falou que era comandante de uma embarcação de pesca e que uma vez por mês viajava e ficava aproximadamente 20 dias em alto mar. Questionado sobre todo esse tempo longe da família ele me falou que nas ultimas viagem sentiu muita falta de seu irmão mais velho que havia morrido vítima de uma bala perdida, em uma troca de tiros entre policiais e traficantes no Rio de Janeiro. Nesse momento meu cunhado interrompeu a conversa e me falou que o falecido irmão era maçom, e que eu havia ingressado recentemente na maçonaria. Quando o aniversariante ficou sabendo que eu era da ordem ficou pálido e trêmulo. Preparou uma dose dupla e “emborcou”. Enxugando a boca com a manga da camisa, me fulminou com um olhar de ódio e disse para todos ouvirem que eu fazia parte do grupo de canalhas que abandonaram seu irmão, por mais de quinze dias, em uma geladeira do necrotério do Rio de Janeiro e não fizeram nada por ele.

Com meu pouco conhecimento sobre os procedimentos em situações desta natureza, tentei defender a ordem, mas devido ao visível estado de embriagues e emocional que se encontrava aquela criatura, nenhum dos meus argumentos foram suficientes para apaziguar os ânimos daquele homem que, enquanto chorava a perda do seu mais velho irmão, ME AGREDIA COM PALAVRAS.

Nesse momento entrou em ação a turma do “deixa disso”, e conseguiram levar o “exaltado” para o jardim da casa, onde tinha um chuveiro, e lá deram um banho para tentar diminuir o efeito do álcool. E lá ficou ele, sentado no piso do jardim, bem abaixo do chuveiro, chorando feito uma criança. Aos poucos o choro foi se transformando em soluços e por fim ele parou de chorar e ao tentar se levantar escorregou e bateu com a cabeça em um vaso de plantas, desmaiando. Imediatamente coloquei-o em meu carro e levei até um hospital próximo, onde foi atendido por um excelente médico, que fez Raio X e o medicou. Enquanto estava sendo observado, contei a história ao médico e ele, o médico, se identificou com sinais, três toques com a caneta em seu bureau, e disse ao seu paciente que o verdadeiro maçom nunca abandona um irmão ou um profano em seus momentos de grandes dificuldades, enquanto que meu cunhado que havia nos acompanhado disse que quando comecei ser AGREDIDO ele esperava que eu revidasse também com agressão e não daquela maneira serena e lúcida que me portei. Eu prontamente respondi que após algumas leituras doutrinárias e filosofias e ingresso na ordem passei a pensar e agir de forma mais racional e a entender melhor o interior do ser humano.

Alguns meses após o ocorrido voltei à Natal e desta vez presenteei o “exaltado” com um conto tibetano que é uma analogia ao fato que acabo de citar. O conto é conhecido por “O MONGE MORDIDO” ou “CADA UM NA SUA”.

O “exaltado”, agora mais calmo leu o conto, me pediu desculpas pelo vexame, me agradeceu, e hoje somos bons amigos.

O conto ao qual me refiro encontrei no Site do Centro Educacional Leonardo da Vinci e passo a transcrever na íntegra:

“Um monge e seus discípulos iam por uma estrada e, quando passavam por uma ponte, viram um escorpião sendo arrastado pelas águas. O monge correu pela margem do rio, meteu-se na água e tomou o bichinho na mão. Quando o trazia para fora, o bichinho o picou e, devido à dor, o homem deixou-o cair novamente no rio. Foi então à margem, tomou um ramo de árvore, adiantou-se outra vez a correr pela margem, entrou no rio, colheu o escorpião e o salvou. Voltou o monge e juntou-se aos discípulos na estrada. Eles haviam assistido à cena e o receberam perplexos e penalizados”.

- Mestre deve estar muito doente! Porque foi salvar esse bicho ruim e venenoso? Que se afogasse! Seria um a menos! Veja como ele respondeu à sua ajuda, picou a mão que o salvara! Não merecia sua compaixão!

O monge ouviu tranquilamente os comentários e respondeu:

- ELE AGIU CONFORME SUA NATUREZA, E EU DE ACORDO COM A MINHA.

Observações: Se todos nós maçons, passarmos a agir de forma racional, de acordo como manda a NATUREZA MAÇÔNICA tratando e respeitando o ser humano como irmão, lapidando as pedras brutas que encontrarmos no caminho certamente construiremos um mundo melhor. Pois a MORAL, a prática das VIRTUDES e o RESPEITO aos DEVERES são os alicerces fundamentais da maçonaria na busca de um mundo melhor.

 

A Maçonaria não considera possível o progresso senão na base de respeito à personalidade, à justiça social e a mais estreita solidariedade entre os homens. A maçonaria nos oferece a possibilidade do aperfeiçoamento, da instrução e da disciplina de conviver com pessoas que, por suas palavras, por suas obras, podem constituir-se em exemplos a serem seguidos.

João Araújo de Farias