SÍMBOLOS MAÇÔNICOS, PÃO E BRIOCHE

 

Tautologia é um termo ou texto que expressa uma mesma ideia de formas diferentes. É dizer sempre a mesma coisa em termos diferentes, explicar um argumento por ele próprio. Mais do que redundância, tautologia é a afirmação de algo lógico ‒ por exemplo: “triângulo é uma figura geométrica com três ângulos”; ora, “tri” quer dizer três, e “ângulo”... é ângulo mesmo! portanto essa afirmação não apresenta saídas à sua própria lógica interna (o exemplo é de Nicola Abbagnano # Dicionário de filosofia, Martins Fontes, São Paulo 2007).

Diz a lenda que Maria Antonieta, ao ouvir a multidão faminta clamar por pão, teria comentado: “mas se eles não têm pão, por que não comem brioche?”. Nesse caso, Maria Antonieta derrapou na sinédoque que é a substituição de um termo por outro, para ampliar o sentido usual de uma palavra: ao clamar por pão, a multidão se referia, evidentemente, a todo tipo de alimento, comida em geral ou meios de subsistência.

Acho que Maria Antonieta matou as aulas sobre figuras de linguagem e acabou  perdendo a cabeça na guilhotina em 16 de outubro de 1793. Para não perdermos cabeça e, junto com ela, o rumo de casa, precisamos atentar para o “tsunami” de tautologias, sinédoques, catacreses, antonomásias, metonímias, metáforas e hipérboles que fazem desmoronar o simbolismo dos rituais e dos templos na Ordem.

O sistema de instrução da Maçonaria (*) é simples e claro, apesar das constantes alterações feitas nos rituais no intuito “de explicar melhor”. O problema está nas instruções e no modo de ministra-las. Essas mesmas instruções martelam, noite após noite em nossas cabeças, no fato de que “a Maçonaria é um sistema de Moral, velado por alegorias e ilustrado por símbolos; que a cegueira em que nos encontramos é o símbolo das trevas; que nos símbolos encontraremos a realidade do dever; que os símbolos podem ser vistos sob múltiplos pontos de vista e interpretações análogas, mesmo que diferentes”, etc. etc. etc. A palavra SÍMBOLO deriva do grego “symballein” formado por SYN (junto) e BALLEIN, (lançar, arremessar, apresentar). Símbolo é, portanto, aquilo que, por analogia, substitui ou sugere algo.

Tomemos como exemplo o COMPASSO, instrumento composto de duas hastes unidas por um eixo articulado na parte superior, usado para tomar medidas e traçar circunferências; ou o ESQUADRO ‒ objeto simples, também composto de duas hastes, porém fixas, formando um ângulo reto, que serve para traçar linhas e perpendiculares. O compasso e o esquadro são usados pelos pedreiros, carpinteiros e serralheiros na medição, corte ou ajuste das pedras de cantaria ou acabamento e fechamento de portas, janelas, etc. etc. Isso todo mundo sabe, desde as criancinhas do ensino fundamental até os pedreiros, os técnicos, engenheiros e arquitetos.

Mas quando o Esquadro e/ou o Compasso ‒ unidos ou separadamente ‒ são “lançados” (“apresentados”) juntos, em direção a uma PROPOSTA de TRABALHO INTERIOR, eles assumem outro significado; outra dimensão.

Dentro de uma Loja, o esquadro e o compasso já não são mais os instrumentos dos pedreiros ‒ profissão da qual nossos ancestrais extraíram o simbolismo. Eles passam a ser o ESQUADRO e o COMPASSO metafísicos, ou seja: transcendem a natureza física do objeto para atuarem em alto grau de abstração. Colocados sobre o Livro da Lei, o Esquadro e o Compasso já não são mais aqueles instrumentos dos pedreiros ou dos arquitetos, mas os determinantes de uma postura de retidão, de caráter, medidas justas e perfeitas que devem pautar a vida do maçom.

É por isso que os Graus de Aprendiz, Companheiro e Mestre são denominados GRAUS SIMBÓLICOS. Tudo e cada coisa nas Lojas Simbólicas apontam para outra dimensão, metafísica, moral e intelectual ‒ acessíveis a todos e quaisquer Irmãos, independente do grau de cultura ou formação.

Neste obscuro Século XXI, modernosas interpretações e canhestras “transmissões de conhecimento” fixam significados restritos para os símbolos. Uma elite de “sábios” vem aí, inibindo seus Irmãos com explicações dos símbolos e respostas prontas para tudo. No entanto, são meras informações que, se levadas a sério, substituem a reflexão e a liberdade de pensar, fatores indispensáveis na Maçonaria. Noutras palavras: “para quem só conhece martelo, tudo que existe no mundo é prego.”

Os símbolos podem ser vistos sob múltiplos pontos de vista e interpretações ‒ cada maçom compreenderá o que é “o seu compasso”; cada maçom compreenderá o que é “o seu esquadro”, “a sua pedra cúbica”, “o seu avental”... Cada maçom amadurecerá e alcançará “a sua pergunta”(1). Nessa multiplicidade, o fundamento nivela realidades análogas, mesmo que diferentes.

 

José Maurício Guimarães

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(1) Para ler meu artigo anterior sobre “A Pergunta do Maçom”, clique aqui:         

https://drive.google.com/file/d/1HcVkSAj8CBpbUGkG26y3Zt-Xl_QBpxZs/view?usp=sharing

 

 

(*) Observação: uso escrever “maçonaria” com “m” minúsculo para indicar o substantivo que indica o trabalho ou a “arte dos pedreiros” da qual nossas oficinas aproveitam o simbolismo. Uso “Maçonaria” com “M” maiúsculo ao me referir à arte, ciências e disciplina que balizam os cânones e padrões de pensamento inerentes ao sistema iniciáticos, independente de Potências ou Lojas.