Sobre Alferes Tiradentes

Joaquim José da Silva Xavier nasceu no final de 1746 em São José del-Rei, em Minas Gerais, de pais proprietários rurais. Perdeu os pais ainda jovem, e foi criado pelo seu tio e padrinho, que era dentista e de quem aprendeu a profissão que lhe renderia a alcunha: tiradentes.

Além de dentista, foi tropeiro, minerador, comerciante, militar e ativista político. Em 1780, alistou-se na tropa da Capitania de Minas Gerais, mas, insatisfeito por não conseguir promoção na carreira militar, tendo alcançado apenas o posto de alferes, patente inicial do oficialato à época, e por ter perdido a função de marechal da patrulha do Caminho Novo, pediu licença da cavalaria sete anos depois, em 1787.

Além das influências externas, fatores mundiais e religiosos contribuíram também para a articulação da Inconfidência na Capitania de Minas Gerais. Com a constante queda na receita institucional, devido ao declínio da atividade mineradora, a Coroa resolveu, em 1789, além de diversas restrições à população mineira, aplicar o mecanismo da Derrama, uma violenta cobrança de dívidas tributárias, para garantir o pagamento de impostos devidos sobre o ouro mineiro.

Ameaçados por uma derrama violenta, os inconfidentes, entre eles, o tenente-coronel Francisco de Paula Freire de Andrade, os poetas Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga e Alvarenga Peixoto, além de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, organizaram-se com a finalidade de sublevar a população mineira a não pagar a derrama e a proclamação de um território independente.

O grupo reunia-se sob o pretexto de serem um clube de poetas, inicialmente conhecido como o Arcádia Ultramarina, e cujo lema de sua bandeira era um verso de Virgílio: “Libertas Quae Sera Tamem”: Liberdade, Ainda que Tardia.

Porém, antes que a conspiração se transformasse em revolução, os inconfidentes foram delatados e presos. Aguardaram três anos pela finalização do processo. Alguns foram condenados à morte e outros ao “degredo”; algumas horas depois, por carta de clemência de D. Maria I, todas as sentenças foram alteradas para degredo, à exceção apenas de Tiradentes, que continuou condenado à pena capital.

Os réus foram sentenciados pelo crime de "lesa-majestade". Tiradentes foi o único conspirador punido com a morte por ser o inconfidente de posição social mais baixa, haja vista que todos os outros ou eram mais ricos, ou detinham patente militar superior.

Em sua sentença, lê-se:

JUSTIÇA que a Rainha Nossa Senhora manda fazer a este infame Réu Joaquim José da Silva Xavier pelo horroroso crime de rebelião e alta traição de que se constituiu chefe, e cabeça na Capitania de Minas Gerais, com a mais escandalosa temeridade contra a Real Soberana e Suprema Autoridade da mesma Senhora, que Deus guarde.

MANDA que com baraço e pregão seja levado pelas ruas públicas desta Cidade ao lugar da forca e nela morra morte natural para sempre e que separada a cabeça do corpo seja levada a Vila Rica, donde será conservada em poste alto junto ao lugar da sua habitação, até que o tempo a consuma; que seu corpo seja dividido em quartos e pregados em iguais postes pela estrada de Minas nos lugares mais públicos, principalmente no da Varginha e Sebollas; que a casa da sua habitação seja arrasada, e salgada e no meio de suas ruínas levantado um padrão em que se conserve para a posteridade a memória de tão abominável Réu, e delito e que ficando infame para seus filhos, e netos lhe sejam confiscados seus bens para a Coroa e Câmara Real. Rio de Janeiro, 21 de abril de 1792

Foi a República – ou, mais precisamente, os ideólogos positivistas que presidiram sua fundação – que buscaram na figura de Tiradentes uma personificação da identidade republicana do Brasil, mitificando a sua biografia. Daí a sua iconografia tradicional, de barba e camisolão, à beira do cadafalso, vagamente assemelhada a Jesus Cristo e, obviamente, desprovida de verossimilhança. Como militar, o máximo que Tiradentes poder-se-ia permitir era um discreto bigode, e na prisão, onde passou os últimos três anos de sua vida, os detentos eram obrigados a raspar barba e cabelo a fim de evitar piolhos.

O barbudo semelhante a Cristo só surgiu no século XX. Em 21 de abril de 1890 houve a primeira grande festa oficial em homenagem a Tiradentes, idealizada e realizada pelo governo republicano, então recém empossado. O marechal Deodoro da Fonseca presidiu a solenidade. Antes mesmo dessa data os republicanos criaram o Clube Tiradentes, em 1882, cultuando seu herói todo dia 21 de abril. A comemoração da data foi suprimida e restabelecida por diversas vezes durante o século XX e mobilizou grupos políticos, intelectuais e a opinião pública em vários debates.

Em 1953 a escritora Cecília Meireles imortalizou o sonho de liberdade dos inconfidentes na obra literária Romanceiro da Inconfidência. A popularidade e uso da imagem de Tiradentes foi reforçada em 1960, quando o presidente Juscelino Kubitschek oficializou a cerimônia do dia 21 de abril, que ocorre todos os anos em Ouro Preto. E em 1965, o então presidente marechal Castelo Branco tornou o dia 21 de abril uma data nacional e um feriado comemorativo.

Sobre Alferes Tiradentes ser ou não um Maçom

Sabidamente, alguns inconfidentes eram Maçons iniciados em Coimbra, como Cláudio Manoel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga e Inácio Alvarenga Peixoto, contudo, não há registros confiáveis que dão conta de que Joaquim José da Silva Xavier tenha sido iniciado. Nos sete volumes dos Autos Devassa da Inconfidência Mineira, publicados pela Biblioteca Nacional (1936), não há qualquer referência à iniciação de Tiradentes ou sua condição de maçom.

Tiradentes, como se sabe, morreu em 1792, quando ainda não existia Loja Maçônica regular no Brasil. Tiradentes jamais esteve em Salvador, Bahia, onde há a teoria da primeira Loja Maçônica naquele oriente, fundada em 14 de julho de 1797 - fato que também não encontra unanimidade. No Rio de Janeiro, onde o Tiradentes sabidamente morou, a primeira loja Maçônica que se tem registro foi fundada em 1801.

Em 1955, Tenório d’Albuquerque, baseado na afirmação de Canêco Amassado, começou a escrever seguidamente sobre Tiradentes-Maçom, passando a surgirem daí inúmeras Lojas Tiradentes, com a adoção do mártir da Inconfidência Mineira, como mártir maçom-brasileiro.

Para Kurt Prober (1984), Tenório d’Albuquerque criou o que chamou de “Herói Maçom”, denominando de “fábula Tiradentes-Maçom” tudo que se refere a sua vida maçônica.

Para alguns, a assinatura de Tiradentes é uma prova da sua condição de maçom. Kurt Prober contradiz, afirmando que a mesma possui cinco pontos: o primeiro está depois da abreviação de Joaquim; o segundo é solto, depois de J, de José; o terceiro está abaixo da letra A, da abreviatura AS, de Silva; o quarto está ao lado de X, de Xer, Xavier
abreviado; e o quinto, no fim do nome, como ponto final.

Os três pontos, que acompanham as assinaturas dos maçons, foram utilizados pela primeira vez num documento maçônico, no Grande Oriente de França, em 1774 (RAGON, 2006). No Brasil, somente após 1815 e, com certeza, em 1822.

Considerações pessoais

Toda simbologia possui um conjunto de signos e de significados. Assim como as palavras, os signos nascem e se transformam com diferentes usos e em diferentes contextos, e com o tempo acabam ganhando novos significados.

É claro que é importante conhecer a história dos símbolos que usamos hoje, mas, independentemente de como surgiu, não precisamos restringir as nossas reflexões sobre o que representa para cada um de nós o simbolismo atual do Alferes Tirantes.

Patriotismo, heroísmo, liberdade e inconformismo são alguns dos valores que o Tiradentes-Símbolo pode nos inspirar.

Que neste  21 de abril sejamos então todos nós inspirados pelo nosso querido patrono, Alferes Tiradentes.

Vinicius Castro

Membro efetivo da Loja "Alferes Tiradentes" Nº 20 - Florianópolis-SC

Referências

Marco Antônio de Moraes. TIRADENTES, MAÇOM INICIADO?. C&M: Revista Ciência e Maçonaria. 2014.

Pesquisa complementar em sites da internet.