Surfar, Navegar ou Submergir?

Durante a última semana, lembrei-me do termo “Surfar na Internet”, e, quando penso nos princípios maçônicos e em como eles se manifestam na vida real, percebo que nem sempre eles são tão elevados, tão polidos ou tão fáceis de seguir quanto muitas vezes se proclama.
Talvez por isso a metáfora entre surfar, navegar e submergir faça tanto sentido para mim: ela expõe, de forma quase desconfortável, o quanto escolhemos permanecer na superfície, mesmo quando juramos buscar profundidade. Aí me veio à ideia, como um Escoteiro do Mar, de me manter dentro d'água e tentar explicar que os maçons são surfistas natos, mas poderiam ser navegantes ou até mergulhadores.
Surfar, por exemplo, é algo que muitos de nós fazemos dentro e fora da Ordem. Deslizamos pelas ideias como quem pega emprestado a energia de uma onda. Falamos de virtude, de moral, de aperfeiçoamento, mas ainda perto da margem, onde é seguro e onde não precisamos olhar fundo demais para o que somos de fato. É confortável manter-se ali, repetindo discursos conhecidos, participando de rituais sem permitir que eles afetem verdadeiramente nossa estrutura interna.
Sempre que percebo isso em mim, sinto que continuo apenas surfando: aproveitando o impulso, mas sem assumir o comando. Já navegar exige muito mais honestidade; é quando deixamos de depender da força da onda para traçar nosso caminho, no entanto, navegar também exige coragem, e ela costuma faltar, pois, longe da margem, ficamos expostos, seja às nossas imperfeições, às incoerências, às contradições entre discurso e prática.
A bússola, que deveria apontar para a razão e para o discernimento, frequentemente gira descontrolada diante de nossas vaidades. Talvez seja por isso que muitos preferem surfar a navegar, visto que o mar aberto revela demais. Contudo, sempre que decido realmente navegar; momento em que assumo a devida responsabilidade (estudo, melhoro, me contradigo e recomeço), descubro que os princípios maçônicos deixam de ser abstratos e passam a ser exigentes.
Mas nada se compara ao ato de submergir, mesmo sendo doloroso e precisando suportar a pressão. Submergir é se aprofundar, é admitir que o problema não está no mundo, nem nos Irmãos, nem nos rituais, está em nós.
Nas profundezas, não há títulos, cargos ou discursos que nos salvem, pois o silêncio da água pesada exige desprendimento, e, ali, nas sombras internas, descobrimos que a verdadeira transformação não é bonita, nem solene; ela é feita de confrontos, fraturas e reconstruções.
O Mestre que não submerge permanece apenas interpretando um papel, não vivendo o real ensinamento. Quando finalmente consigo mergulhar, mesmo que por alguns instantes, percebo que a Maçonaria não me pede que eu seja perfeito, apenas verdadeiro, e, infelizmente, muitos não estão preparados para a verdade.
No fundo, surfar, navegar e submergir não são etapas lineares, mas escolhas que fazemos todos os dias. Às vezes surfamos quando deveríamos mergulhar, às vezes tentamos navegar sem bússola, e, às vezes, submergimos esquecendo-se de voltar à superfície para respirar.
O progresso maçônico não é um caminho iluminado, mas um mar complexo onde cada decisão revela mais sobre quem somos do que sobre o que proclamamos ser.
Se há algo que aprendi com essa reflexão é que os princípios maçônicos não são estátuas a serem admiradas, mas espelhos profundos, e, raramente estamos preparados para olhar neles. Apesar disso, é nessa mistura de superfície, travessia e profundidade que o verdadeiro trabalho se realiza, e é justamente por isso que continuo voltando ao mar, mesmo sabendo que ele sempre exigirá mais do que eu já estou disposto a entregar.
Acredito que essa metáfora entre surfar, navegar e submergir possa também revelar as diferentes atitudes humanas diante da vida: permanecer na superfície, buscar direção consciente ou mergulhar nas profundezas do próprio ser.
Na Maçonaria, que é uma escola para a vida, ela funciona como bússola nessa jornada, a qual orienta o indivíduo, não deixando de evitar os desafios internos. O mais importante é compreender que o verdadeiro aperfeiçoamento não ocorre no conforto da superfície, e sim na coragem de enfrentar as sombras das profundezas, fazendo nossa evolução pessoal reconhecer as próprias contradições e aceitar que a profundidade sempre exigirá mais de nós.
Carlyle Rosemond Freire
Irmão Maçom desde 1994; Jornalista e Cronista; Professor de Arte; Mestre em Educação; Algumas Pós, uma delas em Filosofia e História Maçônica. Membro da Academia Maçônica de Ciências, Letras e Artes - AMCLA; Membro Fundador da Academia de Letras e Artes do Grande Oriente de Alagoas - ALAGOA; Membro do Conselho Internacional de Dança - CID / UNESCO; Membro Fundador da Federação Alagoana de Dança Desportiva e de Salão - FEADS; Membro da União dos Escoteiros do Brasil - UEB.
Fonte: Revista Cultural Virtual "Cavaleiros da Virtude" - Ano XII - Nº 081 - Novembro/2025



